quarta-feira, 16 de março de 2011



XXIX


Há dias que trazem dor de cabeça

Quando se aproximam do fim,

Por se ter visto demasiado,

Mas também trazem o silêncio da noite

E o repouso numa cama quente

Para descansar os olhos do mundo.

Tenho pena daqueles

Que não querem ver,

Porque têm medo da dor de cabeça

(Não se devem lembrar que há noite).



16.03.2011



Turku



(António Montes)


João Bosco da Silva



XXVIII


É tão natural perder como ganhar,

No fim, não haverá mãos vazias,

Nem mãos cheias: não haverá mãos.


A vida ganha-se e no fim perde-se.


Entre o nascimento e a morte,

Tudo foi teu, tudo passou por ti,

Mas nada é eterno nas mãos finitas,

Nada é invencível na luta contra o tempo.


Tudo passa e a vida

É a consciência da passagem.



16.03.2011



Turku



(António Montes)


João Bosco da Silva



XXVII



Hoje, na taberna da aldeia,

Voltei a ouvir a mesma conversa

De gente com desejos, que continua

A não fazer qualquer sentido.


Falam de querer isto e aquilo,

Que não têm, nem conhecem,

Mas desejam.


Falam de estarem fartos disto e daquilo

Que têm, com eles ou em casa,

Que conhecem, que vive com eles

E já faz parte do que são

(Devem estar fartos deles próprios).


Desejam o vazio, o inexistente,

O chão antes do passo dado

(Que poderá nunca lá estar)

E queixam-se do que têm: da vida.


O mal deles é ter mãos

Demasiado cheias e pouco sensíveis.

Faz-lhes falta uma miopia geral nos sentidos

Ou alguém que lhes dê um empurrão

E lhe deite tudo das mãos no chão

(Assim poderão ver o que têm, tinham e perderam).



16.03.2011



Turku



(António Montes)


João Bosco da Silva