sexta-feira, 18 de março de 2011


Haikus à Portuguesa


Seis euros e vinte cêntimos,

Diz o caixa do supermercado:

É contabilista.


Trinta e dois anos à mesa,

A mãe parece a avô

Quando era pequeno.


Uma aliança de ouro

Tudo continua igual.

Quanto tempo?


Um diploma na mão

De quem deixou de saber

O que fazer.


Um cigarro apagado no

Cinzeiro do café:

E agora?


Os segundos passam e

O que trazem não

É o esperado.


Mais um dia que passa.

Não foi desta, mas amanhã

É que vai ser.


Conta da farmácia paga.

Mais uns dias de vida

Com fome.


O viaduto é uma casa grande,

Para quem não tem uma

Casa pequena.


Onde estão os seus filhos,

Alguém pergunta.

“No estrangeiro.”


“Temos” que fazer sacrifícios,

E mais uma mentira é dita

Sem custos.


As andorinhas regressam

Sempre, seja quem for

O presidente.




17/18.03.2011



Turku



João Bosco da Silva



Mãe


Ela não foi feita à medida deste tempo e o seu olhar nunca perdeu

A fragilidade infantil da inocência do século passado.

Não consigo imaginar o esforço de cada passo dado, muitas vezes

Comigo às costas e eu a pensar que caminhava sozinho.

Como eu gostava que as suas verdades fossem as minhas

E as suas certezas fossem ainda respostas suficientes ao meu negro

Ponto de interrogação sobre o papel branco que me deu e fui sujando com o tempo.

Se me lembrasse, sei que as maiores saudades seriam do tempo em que éramos um,

Do tempo em que a sua temperatura me abraçava constantemente

E o seu coração me embalava a vida, antes dos olhos abertos,

Da luz, do vento e do desejo de regressar.

Nunca lhe perguntei que sonhos lhe comi para estar aqui,

Nunca lhe pedi desculpa por ter encontrado uma voz própria,

Afiada, metálica, longe da que ela me queria oferecer.

Tenho medo por ela, neste mundo que ainda vê com os mesmos olhos

Que um dia foram também os meus.



Turku



08.03.2011



João Bosco da Silva



Na Biblioteca



“After all I am alive only by accident”


Sylvia Plath


Ele come enquanto lê o jornal de hoje, com o cantil (de água?) sobre a mesa,

Sacos de plástico debaixo, entre livros de poesia na biblioteca de Turku.

Um piano algures enquanto tento ler mais um poema para fora.

Não tem cabelo e a barba tem muitos dias. O jornal é russo e não consigo engolir

Os versos com o barulho das grandes páginas de jornal a passar nos dedos

Com cheiro a comida. De que tamanho será a sua solidão?

Terá uma casa quente à espera, um sorriso, um abraço, uma cadeira e uma mesa?

A mão regressa ao saco da comida e eu como mais um verso, incrédulo.

Às vezes não sei como é possível um poema com o vento gelado do Báltico lá fora,

Além das paredes da biblioteca de Turku.



Turku



18.03.2011



João Bosco da Silva



Dog´s world


Free dogs at night,

Barking at late drunks,

Barking at

Their own echoes

In the empty

Streets.

Their masters

Aren´t at home,

Not both,

Not all,

The doors are

Closed,

Kids are trying

To get killed

Or getting pregnant.

Only dogs

Seem real

Searching for a last

(Lost)

Remain of humanity

In garbage canes.



B.



Art student who loved vespas


There we were

Near the big lake

While something

Like flashing fishes

Amazed the night.

It was a cold

Night in the

Beginning of spring

And she was

Natural blonde

And orthodox.

Water always

Made my dates

Memorable but

I just couldn´t

Stop thinking

About her juicy

Sweet

Eighteen years old

Pussy.



B.



Turkish lips


Her mouth was

The best cigarette

I ever had,

Lusty wet,

Warm, smooth,

With her excited

Eyes eating me.

I felt burned

In danger

And that

Turned me on

Like I was about

To nail Death

In her perfect

Pale ass.



B.