domingo, 20 de março de 2011



Sábado à Noite


Depois de quatro já se pode mergulhar nos corpos confusos da noite,

Já se podem plantar sorrisos, colher um próprio se a vida o permitir

Nascer com sinceridade, tentar lembrar o nome de quem se senta ao lado

No comboio pela escuridão fora, em direcção à definitiva,

Ver árvores embriagadas, escondidas de desconhecidas dores solitárias,

Desejar mais tempo até recomeçar num mundo novo, noutra manhã.

O sentido perde-se, o sentido que nunca existiu, ilusão de frágil linha

Presa à luz do dia e das responsabilidades que não se pediram,

Sempre em frente, acompanhados por quem estiver, livre dos que desejam

A morte dos outros dentro deles, leves como quem ama tudo, sem exclusividades,

Sem preferências já que a vida é tudo o que nos é possível sentir.

A fome tem tempo, a sede não pode esperar, as pernas um dia fecham-se,

Os olhos precisam de dedos para as pálpebras os empurrarem para a eternidade

E é tão mais fácil ter nada do que ter um pouco, tão mais fácil o infinito que algo,

Não depois das quatro pelas ruas de uma cidade possuída por pobres diabos,

Com uma dor no estômago parecida à solidão, um desejo que é mais forte

E o sono não parece chegar antes de se fazer alguém enrugar o queixo

E apertar os olhos com força com o lençol nos punhos fechados.

Os vampiros não deixam os esquecidos pela luz abandonados

Num sábado à noite e acolhem a fome com a sua sede, mãos frias,

A promessa de uma morte pequena, uma pausa na vida, um momento na eternidade.



20.03.2011



Turku



João Bosco da Silva