quinta-feira, 7 de abril de 2011


Duygu


em Barcelona,



Nunca estivemos juntos em Paris, mas senti-te em todas as ruas,

Cada esquina trazia-me a possibilidade de um reencontro,

Tão longe do tempo das noites quentes de Junho

No berço do meu país em ruínas, quando já duvidava do orgulho

Que senti até perder o sentido, duvidava de quase tudo

Menos da suavidade da tua pele, do sabor dos teus cigarros,

Do teu perfume Lolita Lempicka, que ainda hoje sinto o cheiro

A crepúsculos em varandas com o Sol a pintar o céu de tons laranja

E rosados os teus lábios quentes, com a tua saia fresca

No meu colo de pernas abertas e sede, tu sede, eu sede

E a noite toda o nosso recreio sem ilusões.

Nunca me pediste o que eu não te podia dar e dei-te tudo,

Entreguei-me à tua fome, sem me questionar, sem resistir,

E os barcos que eram partes de filmes passavam por baixo

Das pontes do Sena, ambos longe dos países que fomos,

Amantes sem perguntas desnecessárias, pois ambos seremos

Para sempre do mundo e das mãos que nos souberem tocar.

Cada edifício tinha a tua assinatura, a forma do teu corpo,

A textura impossível da tua pele, ou pétalas de uma flor exótica,

Todos os teus lábios desesperantes, sabor ou vício insaciável,

Toda, tu, o teu cabelo ruivo que tornava o Sol quente

E trazia à cidade o aroma das manhãs de Junho às quatro da tarde,

Diluindo o alcatrão vaporizado até ser possível o Rio Douro.

Um dia serei cabelos brancos, pó e gente nova que julgará

Que sou um armário feio e velho, com olhos cegos no presente,

Mas dentro estarás tu a fazer nascer sorrisos secretos

Longe de Istambul, longe do presente, naquelas tardes de Sol

Que nos cobriam com a noite, para que ninguém notasse

Que o desejo é mais forte que o tempo e torna momentos

Que passam, em eternidades pulsantes na improbabilidade do infinito.



07.04.2011



Turku



João Bosco da Silva