sábado, 16 de abril de 2011


Viagem Numa Guinness


Morri-me e nunca mais serei capaz de acordar numa manhã quente de Agosto

Em casa dos meus avós, não sem uma dor de cabeça e um olhar comprometido

E um relógio parado nas seis da manhã com as unhas cheias de terra e de alguém.

Os joelhos tornaram-se blindados e a cerveja deixou de se beber às escondidas

Quando todos dormiam a sesta: à luz do dia tudo perde o mistério e nem à noite

O cemitério tem gente, só mortos, espelhos do futuro de todos, pequenos montes

Sagrados (que é pecado, não pises) e flores secas, esquecidas e tantos nomes

No meu sangue que eu desconheço. Já não existe aquele que sorria sem vontade

De entrar na carne de alguém, mostrando um desenho colorido para o futuro,

Morri-me e agora restam-me palavras negras a dizer que poema e poucos olhos

No presente que me façam valer a pena. Se ao menos pudesse adormecer e acordar vivo,

Leve, mais eu e menos mundo, apesar de sóbrio, numa manhã luminosa

Em casa dos meus avós e levar as vacas ao lameiro da minha solidão sincera,

Regressar às lágrimas da dor física e da frustração por um brinquedo

Que não dormirá debaixo da minha almofada… o Sol brilha e tudo é negro.



16.04.2011



Turku



João Bosco da Silva


Amorror


És um glioblastoma e a tua presença é uma dor de cabeça que me faz vomitar.

O que sinto por ti é uma pressão intracraniana aumentada e nem todas

As agulhas do mundo poderão aliviar o que só o tempo vencerá: ambos.

Os nossos beijos são agora secreções biliares e um vazio que me quer abandonar,

Os olhares são penas e cada toque dói-me como um sismo.

Amanhã seremos lágrimas de quem julgava conhecer-nos e um luto

Inútil para o esquecimento. Ninguém nos ensinou que a realidade é mais frágil do que a ficção

E vivemos a vida na ponta de um bisturi que oxida.



16.04.2011



Turku



João Bosco da Silva