terça-feira, 7 de junho de 2011


O Meu Avô e Bukowski


O Bukowski podia ser meu avô (ter sido), mas o meu avô só bebia e em vez de escrever

Caçava, trazia fardos de contrabando de Espanha e tratava da sua vinha: circunstâncias,

Necessidades e países diferentes. Tenho pena por não ter escrito enquanto ele recitava,

Algo mais que poesia, vida e amigos da guerra civil espanhola, ironia e seu irmão da polícia secreta,

Meio-irmão e outro em França com uma vida que levou com ele, três irmãos de três pais diferentes,

Nenhum deles Bukowski. O meu avô sabia ler e escrever numa aldeia esquecida por todos,

Menos pela fome e pela guerra, num país analfabeto, governado por um hipócrita de voz esganiçada

E sem força, o meu avô ia buscar ao monte carne fresca e sabia mil e uma maneiras de evitar

A fome, mesmo no Inverno com a água do rio tão gelada e peixes fritos em azeite das suas oliveiras

Pequenas. Como Bukowski, o meu avô tinha a língua solta, o pavio curto e mesmo assim tinha amigos

Num raio de quinhentos quilómetros, aos quais tratava por “azeiteiro” ou “paniscas” ou “meu filho (da puta)”

Quando não “mandicante” e agradeço-lhe a falta de travão na gola e nos dedos,

Neste mundo cheio de merdas, de rodeios para perder tempo, enquanto se morre sem se contar.

Muitas vezes vejo o meu avô em Bukowski, como se em vez de ter aparecido no mundo em Cidões,

Em Los Angeles, nascido em Andernach, mas morreu numa cama de hospital, amarelo,

Deixando no mundo, ao mundo as palavras: Aniceto Estêvão da Silva.



Turku



07.06.2011



João Bosco da Silva