sexta-feira, 17 de junho de 2011


Juncos No Lameiro Do Meu Avô E Outras Interjeições Sem Tentar Ser Estrume De Betão


Não há nada como o cheiro verde dos juncos no lameiro do meu avô numa tarde do fim do verão,

Impossivelmente fresca, a vida, o sangue não parece e é, raízes que desenham o calor que tentamos,

Enquanto o sino da igreja de outros séculos ainda nos diz que são horas de regressar com as vacas,

Com o estômago reconfortado com o pão tosco e as fatias grossas de queijo, porque o Tulicreme

Acabou e é domingo, daqueles domingos de uma sexta-feira à noite a milhares de quilómetros da felicidade

Em quilómetros de tempo, só comparáveis àqueles que atravessavam o Marão, nas segundas

De sono mal dormido entre curvas e cheiro a suor ao lado, ou uma velha chata que insiste em conversas

Segunda-feira pela manhã, quando o ódio pela vida começa ligeiro como um bebé de noites pesadas,

Pelo amor de deus, ainda falta muito para o inferno, ou acordei com esta dor sem dor, já a descer

E nem se nota a diferença de pressão, de pressão verde dos últimos anos a preto e branco

E cheiro a entre pernas, de amanhã ou horas de ontem, o que se quiser, o que se puder evitar

Como um ponto final, daqueles que se agradecem como mulheres das que nos matam e ainda bem,

Só assim se pode renascer de novo, estender as asas flamejantes e continuar a fazer merda pela vida fora,

Porque não há outro sentido, além do sentido único, entra: sai e tem que ser, viva o kitsch

E o Milan Kundera, que me vem com tretas de balanças, mas o que interessa é que me chupou como

Se o amor fosse algo verdadeiro, mas resulta, mais a ilusão, a promessa muda, que a palavra,

Evite-se ou ser-se-á evitado, tal o ridículo das vacas que nem dão leite se leite engolem,

Nem bifes, porque a igreja diz que é pecado e as leis dizem que vais dentro e na verdade mete nojo,

Porque a carne não se quer doce, sendo tão amarga enquanto se move pela vida a fingir que vida,

Mas não há nada, nada como o cheiro dos juncos, junto daquele poço onde se afogou o cão do meu avô,

Naquele lameiro da mitologia pessoal, onde o início do inferno tem consciência em forma de uma ressaca,

De dedos mal lavados e candeeiros loiros que pingaram luz e ainda bem que a barba ainda escassa na altura,

Ou resíduos colados à esperança da continuidade, antes, antes de antes e do sem sentido

Que é a vida vida… nunca saberei o que é a vida e morrerei e serei esquecido e será como se nunca,

Por isso agora, portar-me-ei como se nunca e já é nunca, o que acabou de ser, esquece-se tão rápido

Uma estrela, que a luz persiste, depois, depois e quanto mais distante do nosso mundinho,

Mais tempo a luz tardará a chegar, mas chega, para nunca mais, para mais um orgasmo

E até nunca mais, que o nosso filho nunca será e se for, nunca nosso, um estranho familiar, o mais estranho

De todos, o mais próximo, a ser pedaços de nós, mesmo não fazendo ideia que os juncos

Cheiram a verde e a chuva em Agosto enche as veias e há festas e adros de igrejas, escuros,

Onde o pecado sabe melhor, sente-se pouco por causa dos finos e da música reles,

Cheira tão bem ser chamado de Amigo por um amigo, daqueles que nem é preciso falar muito

Para saber muito sobre, mas sabe tão bem, quase tão bem como mijar dezenas de cervejas de uma ponte

Romana para um rio que seca cada vez mais, todos os anos, por culpa dos espanhóis, dos portugueses

Sem tomates, porque todos devem ter morrido depois do Brasil e da Índia e se restam alguns,

Acordam demasiado cedo de manhã para cozerem o pão, ou para curarem os mais doentes,

Ou para levarem os doutores a lugar nenhum onde fazem tudo menos alguma coisa,

Ai o cansaço disto tudo, a estas horas de gotas lentas e chatas, sem juncos, sem aqueles juncos

Ao pé do poço, naquele lameiro verde, vale em miniatura, onde o meu avô me esculpiu a felicidade

Em forma de bois de cortiça, hoje tão perdidos quanto o camponês que tenta ser poeta,

Num mundo onde só idiotas de betão com cheiro a estrume nas ideias, são reconhecidos como poetas

E lá no fundo próximo da sua alma, corpo, querem encher a boca não de palavras, mas da minha carne tosca.



17.06.2011



Turku



João Bosco da Silva