quinta-feira, 19 de abril de 2012


A Exigência Da Fome Pelas Inúteis

Escreve-se melhor com fome, com as sensações sacudidas pelo sono, as últimas
Gotas de sonhos ainda se despedem no esquecimento, as palavras gostam de fome,
Procuram o vazio e aí se multiplicam, são irmãs do priapismo matinal, viciadas
Em níveis baixos de serotonina, e contudo necessitam dias bons para se solidificarem
Nas circunvoluções, vizinhas do herpes à espera da fraqueza, da fome, latentes,
Lactentes do medo, da incerteza e da confusão, de barrigas cheias estão os livros
A arder, demasiada atenção na confecção dos sucos gástricos e as demais enzimas,
Inutilidades quando os dedos pedem carne de alma, os dedos que empurram êmbolos,
Primem gatilhos, levam à boca e com uma carinha daquelas qualquer um se dedicava
Às mamadas, com uma carinha daquelas as palavas não se ouvem, só olhos e palidez
Que pede a violência de um contágio, a perdição num sorriso, tantas fomes
As mães dos poemas, dos não poemas, das sedes e dos suicídios que duram luas e luas,
Hipoglicémias e alcolémias, fumos entranhados até aos ossos dos mortos futuros,
Inibidores selectivos da recaptação da serotonina, porque a vida não chega,
As palavras exigem miséria, miseráveis famintos de barriga cheia, chamas
Nas casas ao lado, alimentando a hipocrisia, as palavras tão necessárias como a vida.

19.04.2012
Turku
João Bosco da Silva