terça-feira, 15 de outubro de 2013

Discurso Enquanto Mosquitos Chupam

Da injustiça incoerente diz-se que é o que temos, pela dos nossos padres, eramos todos,
Literalmente, ovelhas vestidas de freiras com o rabo alçado, tudo o resto é pecado,
O que está fora do alcance dos seus bolsos e braguilha, na verdade somos vacas
Num matadouro, prontas a enriquecer uma multinacional e engordar muitos burros de morte,
Falta harmonia neste estrume, traçam-se linhas rectas sobre o horizonte recortado pelo tempo
E espera-se com isso tornar tudo mais habitável, mais controlado na verdade, ilusão,
Tudo é à imagem e semelhança do dinheiro, um geometria para olhos brutos, cegos pelo
Brilho frio do ouro, daltónicos para as cores da geometria divina das coisas pequenas,
Há uma grande lição na  Ishavskatedralen em Tromsø, algo que os bárbaros do Sul nunca
Conseguirão compreender com a sua visão moldada em forma de cruz e claustro, por cá,
Desiste-se da montanha a meio, divinizam-se as putas e elevam-se os verdadeiros ladrões,
Falta canonizar os assassinos imunes e indiferentes às fomes que espalham pelas vidas,
Cada vez menos livres, cada vez menos livros, cresce a estupidificação em massa,
Vestida de loiro artificial, mamas de revelação rápida e pernas de abertura fácil, tudo com
O software de um tamagotchi, somos quadrados e agudos, confundimos depressão com
Profundidade, reflexão com preguiça, anémico com anímico, inúteis pedantes cheios de
Certezas válidas apenas nas próprias loucuras mal diagnosticadas, no tabuleiro pessoal
Do Monopoly, somos o país do Sol, onde se é sombrio todo o ano, o escroto estéril da Europa,
Ainda cheio de si e das recordações de fertilidades antigas, aqui fode-se por número e por
Submissão, por favor a favores, não se espera o orgasmo como recompensa, mas que seja
Breve e que venha rápido o que se espera das calças aos pés da cama, sempre com um saldo
Ridículo e humilhante na tolerância às papilas gustativas e olhares frontais, capital dos sorrisos
Amarelos, das amizades da pança cheia e dos cornos afiados de perto, dos olhares de esguelha
Em direcção ao lado da braguilha, se fosse alguém, queria ser norueguês e descobrir o Novo Mundo.

11.10.2013-15.10.2013

Torre de Dona Chama – Coimbra


João Bosco da Silva
Atacador

O que enlouquece, não é a morte de alguém
Querido, ou a doença, não é o abandono, ou o esquecimento,
Não é perder um amigo, o que enlouquece é o autocarro que se atrasa,
São os taxistas com a sua pressa de fazer pouco,
É uma linha que se transforma numa corda ao se aproximar da agulha,
São as filhas da puta das rotundas, onde todo o civismo
Converge, voltas para logo ali, ou lado nenhum,
O que enlouquece é a prisão aberta em que se vive, cheia de olhos
Para fora, inquisidores sem pecados com os bolsos cheios de pedras,
O que enlouquece é acordar tarde, abrir o frigorífico e não ter
Nada para comer, com dinheiro na carteira, para pagar contas
De merdas que não se chegarão a usar, o que enlouquece
É engolir a vontade saudável de ser homem e esconder nos lençóis
Os sonhos que matam mais um pouco ao se acordar,
O que enlouquece não é sobreviver a um grave acidente,
É ter um furo, no meio do trânsito e sentir-se completamente só,
É não ter um euro para se ir cagar à casa de banho, numa cidade
Grande, cheia de arte, cultura e gente sem cu,
O que enlouquece é ter a loucura aprisionada,
Esconder a luz e andar pelo mundo às apalpadelas,
Ter um cigarro e não ter isqueiro, beber no silêncio,
Dormir com os pés quentes e sonhar que se fode,
Estar a um metro quando falta um metro, mastigar e não engolir,
Não conseguir arrancar um pêlo com a pinça e ter que o arrancar
À dentada, ter perdido o que se poderia ter tido,
O que realmente leva a caçadeira à boca, ou os comprimidos,
Não foi a porrada que se levou, é o silêncio numa noite
De Lua cheia, um tecla que se falha no fm de mais um poema.

Coimbra

João Bosco da Silva


08.10.2013