quarta-feira, 3 de maio de 2017



10 Anos

“La memoria es el amor profundo
Entre las piedras y los rios.”
Pablo Javier Perez López

Água do rio da terra corria para o Douro, a mesma água que espelharia
Dali a uns meses mais quentes as uvas que fariam o vinho que agora bebo,
O rio corria e eu corria no estrangulamento estéril das tuas virilhas incansáveis,
As folhas das videiras lambiam toda a luz possível antes da noite desabar
No teu cabelo húmido antes da festa, e o vinho 10 anos depois numa
Garrafa estranha, entrando num corpo com um cansaço familiar,
O pescador mais atento ao ranger das molas do que à boia,
Quem diria que a rolha ao saltar um dia te acertasse numa dessas promessas
Possíveis que encerravas em ti desde que nasceste, a terra ao sol
Por lentes de rubi, como a chegada que esperavas sempre que a vontade
Ia além da prevista perfeição, a água tornar-se longínqua, estrangeira,
O vinho a fermentar em cabelos brancos e murros nas paredes,
Os avós todos alimentando a fome de pó que a memória não sopra,
Tantas vidas desencontradas em madrugadas de sonhos inúteis,
Hoje neste copo de porto, à distância de 10 gerações de folhas secas.

02.05.2017

Turku


João Bosco da Silva

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