sábado, 26 de outubro de 2019

“The Bell Tolls For No One 

A esta hora os dedos cheiram a alho, os bifes estão a marinar, 
Enquanto isso pego em mais um conto de Bukowski, porque é Novembro, 
O segundo amor tinha-o deixado e passa um fim de tarde com 
A sua amiga Vicki, vão até ao The Hollywood Cemetery 
E às tantas ela diz “we should fuck back here”, estranhamente ele recusa, 
Contudo beija-a longamente entre o silêncio dos mortos, 
Também eu tinha deixado um dos meus amores longe naquele 
Início de primavera, quando te beijei no cemitério da terra, 
E entrei pela primeira vez no teu corpo violento, 
Havia poucos dias tinhas fodido um amigo meu no seu carro, 
Depois de regressarmos os três de uma noite nos copos 
E me teres dito numa mensagem que me querias a mim, 
Ele disse-me que gostavas de levar no cu, eu gostava de calças brancas, 
E lembro-me de te ver pela primeira vez através das janelas partidas 
Da minha casa de infância, com a tua prima, sempre tiveste uma beleza silenciosa, 
Não demoro em amanhar os bifes, acabo o conto, acabo o poema, 
E é por isto que gosto de Bukowski, não deixa de com a sua perdição 
Me trazer o doce gosto derrotado do que estas mãos com cheira a alho 
Uma vez tocaram, para nunca mais. 

Turku 

26.10.2019 

João Bosco da Silva 
A Sede da Última Cerveja Depois do Tasco Fechar 

Não digas que não te amei, que ainda acordo com aquela noite de Novembro 
Na boca, como uma ressaca de demasiados cigarros, chupados como quem 
Quer encher o vazio com fumo, naquela noite esperavas-me tu 
E aquela professora de história, ainda não tinha espatifado o carro 
Com o vinho do porto, já era tarde e não me atrevia ir à máquina automática 
Comprar preservativos, pedi no café ao meu amigo que só tinha um, 
Mandei vir uma mini e decidi enviar-te uma mensagem, a ti, 
Chegas pouco depois, tomas um café e vamos dar uma volta, 
Que é como quem diz, foder nos bancos de trás no largo da feira, 
Primeiro fazes-me uma mamada e engoles tudo, depois lá dou uso à amizade 
E montas-me com sede até me fazeres vir outra vez, impões-me o carinho 
Pós-coito e dizes que é o teu momento favorito, soube-me bem cheirar 
O teu cabelo húmido, ter-te nos meus braços, quase me soube melhor 
Que ter o teu corpo magro empalado pelo meu caralho, levo-te a casa, 
Ali perto, envio uma mensagem à professora e fodo-a no adro do santuário 
Sem preservativo, que se foda, como vez, amei-te, escolhi-te, 
Mesmo depois de anos antes me teres trocado por quem com muita 
Dedicação de dedo, te ensinou a música do grelo espinha acima, 
Que nessa mesma noite, entre a mamada e o salto no espeto, 
Me ensinaste, a tua mão sobre a minha a marcar o passo até ao espasmo, 
Não digas que não te amei, porque se a amizade é dar o único preservativo 
Numa noite fria e vazia de Novembro, o amor é usá-lo, mesmo que depois,  
Algo tão incerto como a história, se tenha que penetrar sob estrelas dançarinas,  
Com a vontade de abismos e a sede da última cerveja depois da hora do tasco fechar. 

Turku 

25.10.2019 

João Bosco da Silva 

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Poema Derrotado 

À tua frente a possibilidade do melhor poema, 
Porque da vida já pouco esperas, é só pousar os dedos 
Na ordem certa, mas o que os move é a mesma lesma 
Que passou, só a certeza brilhante daquele visco seco, 
Nas ervas do caminho outonal, nada resta dos bagos 
Dos verões passados, nada há a destilar a não ser 
O ódio e o vazio, o amor é um vinagre com que 
De manhã se lava a boca do gosto dos sonhos 
Ridículos que se vão pegando às manchas da almofada, 
À tua frente um espelho, velho, sujo, que come mais luz 
Do que a que reflecte, o poema possível a quem sacudiu 
Amigos com o tempo e ficou na companhia do pó 
E do cansaço que mil sonos não curam, a certeza silenciosa 
De todos os sorrisos azedos, sob os dedos que não tocam, 
Passam, deixam a despedida das moscas antes dos dias frios. 

14.10.2019 

Turku 

João Bosco da Silva