segunda-feira, 9 de setembro de 2019



Muitas Folhas Caíram - Haikus 

Em casa dos meus pais 
não me encontro 
nos espelhos. 

Voam duas libelinhas 
apaixonadas - 
seca o exosqueleto no junco. 

Passa a água 
diluem-se as memórias -  
mosca pousa na merda. 

Cai uma folha 
na água - 
Julho ainda. 

Amanhã haverá festa 
quando 
as lágrimas? 

Esta brisa como solidão 
sede de silêncio 
um espaço vazio. 

Dourada pelo Sol 
a minha pele -  
verde sempre verde. 

Que procuras libelinha 
na sombra do rio 
ao entardecer? 

Para quem o que 
no ar desenhas 
libelinha? 

Roça o pinheiro 
no eucalipto -  
o céu ignora. 

A água que há pouco 
no corpo 
agora eu. 

Eu que depois 
do último suspiro 
tudo e nada. 

Olhos em Espanha 
pés em Portugal 
lembra-me o invisível. 

Quantos destes 
ainda os pinheiros 
da minha infância. 

Escorre a prata 
em direção aos sonhos -  
verde distância. 

Não sei se a brisa 
se um pássaro 
que passou. 

Tanto verso inútil 
e aqui 
mais três. 

Trinco a sombra verde 
do pinheiro manso -  
encho os pulmões de calma. 

Atrás da montanha 
a nuvem 
desaparece. 

Sacho na terra 
gota de gente -  
aço quebra.1 

Pétalas no ar 
na minha pele 
as tuas lágrimas.2 

Na floresta de pedra 
dorme o cão 
sem dono. 

Olha-se pouco 
para as estrelas -  
amanhece. 

Na vila adormecida 
ladra um cão -  
estrela cadente. 

Cantam os grilos 
na noite lenta -  
o gato adormece. 

Na mesa sem gente 
a faca 
inocente. 

Passa por mim 
o vento -  
assobiamos. 

Muitas folhas caíram -  
cada vez  
sei menos. 

Tudo fecha 
tudo arde  
fragas permanecem. 

Já a chuva lavou 
o papel onde 
se limpou o cu. 

Este tédio 
que zumbe -  
canícula. 

Sombra que nada 
apaga -  
distância. 

Ouço no pinheiro 
o verde 
que passa. 

Eu e o gato 
passamos 
como tudo. 

Essa longa 
despedida -  
vida. 

Cheguei verde 
despeço-me 
amarelo. 

Cidões-Seixas-Moledo-Torre de Dona Chama 

Julho2019 

João Bosco da Silva 

1,2 Co-autor Nuno Bernardo