terça-feira, 1 de fevereiro de 2011



Esperar


Só porque às vezes apetece, só porque sabe bem esperar,

E deixar cair letra a letra as palavras, palavra a palavra as ideias,

Escreve-se mais um poema, mais um momento que se esquecerá,

Que tenta perdurar na inutilidade dos versos irregulares,

De uma cabeça que olha o horizonte muito séria,

Com o som do vento dentro, com as memórias que o verde lhe traz

E nada mais, porque ainda não são horas, nem o relógio se sente,

Só o Sol que se despede e aquece com a despedida, ao contrário do resto.

Não vale a pena imaginar o que não é ainda, não vale a pena ter medo,

Não enquanto se espera, sentado, que as palavras acabem,

Que as ideias se aclarem para se poder deslocar

Em direcção às emoções verdadeiras, livres de sonhos pequenos,

Livres das vidas em calhas, que seguem com o fim traçado,

Em direcção a uma vida de engano, não vale a pena agora.

Agora deixa-se cair, gota a gota o que resta da ilusão que se rompeu,

Para ir vazio, limpo, de braços abertos para o que vier,

Seja mais do mesmo, pior, melhor, ou o que nem se imagina,

E o futuro é sempre um que nem se imagina,

Por isso todas as decisões foram em vão, todo o medo, toda a incerteza,

Porque o controlo é este, agora, sentado, à espera da última gota,

Para me erguer uma vez mais e conquistar mais um mundo,

Mais uma vida que nasce. O cemitério das outras fica no silêncio

Dos muros além dos meus olhos, não valeram o suficiente,

Não tiveram força, por isso esta nasce e segue

E eu sigo com ela, enquanto espero, só porque me apetece,

Deixando cair letra a letra as palavras, palavra a palavra as ideias,

Enquanto crio mais um esquecimento, para deixar num banco,

Até chegar a hora e nunca mais, nunca mais no mesmo lugar no mesmo tempo.



31.01.2011



João Bosco da Silva