terça-feira, 8 de outubro de 2013

O Principio De Incerteza Do Fim Certo

“Na minha vida, a única coisa certa é a confusão.”
Pedro Juan Gutiérrez

Podia ser um fim de tarde quente de Junho, perto do fim da inocência, na esplanada
Do café perto da escola, a beber uma Frize limão a falar do que não se conhecia, o desconhecido,
Que na altura se chamava de futuro e era visto como algo branco, uma página, à espera
Da nossa vontade, do nosso esforço, das nossas cores, hoje já se sabe, que o desconhecido
É algo escuro, dominado pela sombra, só a incerteza é comum, sem pinga de optimismo,
Falava-se dos livros que se iriam comprar, quando se vivesse na cidade, sem as limitações
Do que está à mão e toda a gente lê, a época de Nietzsche, Schopenhauer, Sartre e
O agradecidamente obrigado Ferreira para os apagões das primeiras insónias, podia ser um
Fim de tarde quente de Junho, mas não é, nem há esplanada, nem os velhos amigos, cada um
Cada vez mais outros que eles mesmos, os anos ainda trazem vida a alguns, vida e brinquedos
Espalhados pelos corredores, os que nunca se tiveram na infância, podia estar a beber uma Frize
Limão e esperar tranquilamente pelo tudo ir dar certo, mas não, bebo um gin tónico com
Pepino enquanto a noite arrefece o dia de Outono e espero, inquietamente, por um pouco
Mais de nada, que o desconhecido se revele num mais ir andando, são as palavras possíveis,
Vai-se andando, tudo na mesma, e a vida, vai, enquanto for menos mal, desde que as curvas
Da estrada se façam, desde que a dor vá passando e haja ao menos um dia ou outro para
Enfiar a cabeça num copo ou numa garrafa e lembrar alto o delicioso que era o pouco que se
Tinha nas mãos, quando as mão capazes de segurar em tudo, ilusão, as mãos mal aguentam
Mais uma noite, escorre pelos dedos e no fim, pouco mais fica que um bocejar amargo ao
Longo do dia, procura-se num livro a inocência que se deixou esquecida na cadeira daquele café,
Mas os livros, cada vez mais, são reflexos do desencanto, uma reclamação às promessas que
Nunca nos foram feitas, uma lista de tudo que nos foi quase dado, das lições que, essas sim,
Nos foram oferecidas à força do chicote e da humilhação, é para aprenderes, agora lê-se,
Não para encontrar, mas pela companhia, agora bebe-se com Bukowski, vai-se ao engate
Com o Miller, viaja-se com o Jack, mete-se com o Will, fuma-se com o Juan Pedro,
Consulta-se o Dr. Thompson sobre os malefícios do tédio, às vezes procura-se um pouco
De ar num poema nórdico, ou a familiaridade num romance finlandês, revisitam-se os museus
Que no café da terra faziam parte de sonhos, os quadros que só nos manuais de educação visual,
Até o professor morreu, mas que esperar, se o gelo do gin já derreteu e o copo transpira como
Se em privação de álcool, sei que o mestre continua a visitar o café diariamente nos dias de aulas,
Porque os mestres são constantes, atingiram um nível máximo de fidelidade, o devir é algo certo,
Constante, e já se sabe, que quando se abrir a caixa o gato poderá estar morto, portanto,
Seguem, com a certeza de um gato dentro da caixa fechada e nada mais, o resto é levar o dia à noite,
Porque a família em casa espera e tudo o mais é esquecimento, um aluno que um dia não
Esperou ser tanto, nem tão pouco, tão menos daquilo que os olhos lhe prometiam,
Do verde, resta o pepino no fundo do copo e daí nem isso, que também o mastigarei,
E amanhã de manhã, será mais um verso, sobre isto, o principio de incerteza do fim certo.

Coimbra

07-10-2013


João Bosco da Silva