Sábado à Noite
Depois de quatro já se pode mergulhar nos corpos confusos da noite,
Já se podem plantar sorrisos, colher um próprio se a vida o permitir
Nascer com sinceridade, tentar lembrar o nome de quem se senta ao lado
No comboio pela escuridão fora, em direcção à definitiva,
Ver árvores embriagadas, escondidas de desconhecidas dores solitárias,
Desejar mais tempo até recomeçar num mundo novo, noutra manhã.
O sentido perde-se, o sentido que nunca existiu, ilusão de frágil linha
Presa à luz do dia e das responsabilidades que não se pediram,
Sempre em frente, acompanhados por quem estiver, livre dos que desejam
A morte dos outros dentro deles, leves como quem ama tudo, sem exclusividades,
Sem preferências já que a vida é tudo o que nos é possível sentir.
A fome tem tempo, a sede não pode esperar, as pernas um dia fecham-se,
Os olhos precisam de dedos para as pálpebras os empurrarem para a eternidade
E é tão mais fácil ter nada do que ter um pouco, tão mais fácil o infinito que algo,
Não depois das quatro pelas ruas de uma cidade possuída por pobres diabos,
Com uma dor no estômago parecida à solidão, um desejo que é mais forte
E o sono não parece chegar antes de se fazer alguém enrugar o queixo
E apertar os olhos com força com o lençol nos punhos fechados.
Os vampiros não deixam os esquecidos pela luz abandonados
Num sábado à noite e acolhem a fome com a sua sede, mãos frias,
A promessa de uma morte pequena, uma pausa na vida, um momento na eternidade.
20.03.2011
Turku
João Bosco da Silva