Flash Naquele Dia Antes Da Noite
Um sorriso e uma dor de cabeça, uma ilusão e uma sede de nada
Que só o vazio pode desmentir, haja chuva quando se morre seco
Que nunca se terá aquilo que se esperou às seis da manhã
No sexto piso no dia seis de um mês impossível,
Enquanto comprimidos brancos fazem a vez de momentos
Que deixaram de se sentir nas veias, nas circunvoluções
Do esquecimento inevitável num dia de chuva com gente vestida
Para parecer triste, muitos só porque tem que ser e parece bem.
Quantos fazem lembrar aqueles tios que queríamos ser
E depois nem perto, um doente terminal fascinado por postes
De alta tensão, cansado nas pernas da vida pelo peso do seu fim,
Teias de aranha e madeira apodrecida, a sua casa enferrujada,
Tão rico, porque as mãos abriam-se com facilidade de alegria.
Matam-se nos copos, bebem o cérebro, torna-se difícil
Limpar o próprio traseiro e a culpa é do peso da vida,
Demasiado única, excessivamente importante, única coisa importante
Para se levar a sério, um sorriso, uma dor de cabeça, uns minutos atrasado
Pagos com a eternidade, a dor, uma grama pelo fim,
E os perdidos, alienados, que querem salvar os caídos do abismo inelutável
E mais vale colher a merda de um cão que se leva a passear
Como que para ocupar uns segundos a mais,
Que perto do fim se daria tudo o que nunca se teve de verdade,
Porque não se tem nada de verdade a não ser a vida que se perde.
Não há música que desculpe a inevitabilidade de um azul demasiado escuro
Do tamanho da eternidade, fazendo o infinito parecer pequeno
À luz da evidência mais forte que todos os deuses.
Despem-se os anjos e nada se revela, apenas uma imagem de fome,
Uma dor de quando não há dor, um reflexo a encher bacias brancas
Que deitam no abismo sacos cheios de sonhos que nunca chegarão a sentir a queda.
20.04.2011
Turku
João Bosco da Silva