terça-feira, 26 de abril de 2022

 


“Un Dernier Verre”


Desta vez não me sento no granito áspero de uma relíquia paleolítica,

Enquanto sou malabarista de reminiscências
e doces ruínas,

Estou longe da canícula do verão e da frescura de luar naquela fraga,

Sobre a qual, saindo de ti, verti o meu esperma embriagado,

Tão breve o nosso encontro de sonho e ilusão, que mais torna esta vida

Significante, anda, temos tempo e vontade ainda, digo-te desde Montmartre

Que arrefece, enquanto o vinho aquece no copo e eu tenho ilusões

Que quase consigo tocar, como quando a juventude permitia,

Agora que sou a única ruína possível, num mundo que cheira a sabão

E aparências, ser feliz é engolir resignadamente cada dia em seco

Desta vez sou eu o granito e a memória em forma de lenda,

Que aquece a solidão das tuas noites, que ilumina o teu tédio

E torna o meu desejo útil como um deus e o medo.


Paris


25/04/2022


João Bosco da Silva