quinta-feira, 27 de agosto de 2020

Summertime Sadness


Estas moscas de fim de verão, à volta de um saco de recordações 

Apodrecidas, fruta que fermentou em melancolia, 

Incomodam como os amores perdidos que nos visitam a solidão, 

Abrindo-nos mais os olhos ao abismo que separa tudo o que fomos, 

Em quem fomos, o sol arrefece os dias antes de incendiar o horizonte, 

As moscas num cansaço inquieto, escrevem no ar tudo o que ficou por fazer, 

Que foi tudo o que realmente valia a pena, agora esperam, 

Que não haja mais folhas nas árvores e sorrisos em lábios quentes, 

Estas moscas de fim de verão, como os bêbados solitários no fim do arraial, 

 À espera que o primeiro tasco abra, para agarrar mais um dia, sem vontade. 

 

 

27.08.2020 

 

Turku 

 

João Bosco da Silva



Cruzamento de Gado

Hoje vi o amigo que às vezes entrava em ti,
Empurrava um carrinho de bebé, ao seu lado ia uma mulher,
Parecida ao teu corpo com as luzes apagadas,
Terá sido mais um tiro no escuro, num dos barcos encalhados
No desespero e na sede, tu podias ser ela,
Mas pela idade da criança, ela já amiga do teu amigo,
Quando às vezes entrava em ti, não sei, nunca fui bom a matemática,
Mas feitas bem as contas, entre nós, o resultado seria sempre o mesmo.

Turku

19.08.2020

João Bosco da Silva


Deambulação Onírica

Sem vontade de pegar na caneta, tenho rabiscado no ar dos passeios
Dum verão que não me pertence, se soubesses onde ficam os meus sonhos,
Vinhas ter comigo, dar corpo à tua imagem, nunca gostei de impossíveis,
Todas as possibilidades me afligem as mãos fechadas nos bolsos,
Desejo-te sol, onde quer que te encontres, os passeios continuam
Tão distantes como sempre e as linhas que os pés escrevem, ninguém as vê,
Também isto é caminhar sem destino, tu sabes, cada olhar que se cruza,
Todos os gestos que nos podiam tocar, todos os sonhos, onde nos encontramos.

Turku

21.08.2020

João Bosco da Silva