terça-feira, 24 de maio de 2022

 

Pouilly-Fuissé e Nada

 

Podia estar a fazer pipocas, mas continuo a alimentar ilusões,

Desperdício de copos embutidos, Pouilly-Fuissé, vinhas velhas,

Torna-se cada vez mais difícil mencionar o que leva um gajo a isto,

Alguém me diz que pena, amanhã tenho que trabalhar,

O resto está tudo longe e há muito deixou de valer a pena

Meter mais gente neste raio de vida, não consigo sequer

Atender toda a gente nas férias de pobre que me são possíveis,

Entretanto adormecem, eu fecho a porta da varanda,

Encho o copo e aqui estou, a pensar que realmente também eu

Não fui feito para viver, seria uma pedra excelente,

Aguentaria sol de quarenta graus, ventos e tempestades,

Tinha que ter calhado ser carne e fraca, com vontades

Maiores que a miséria, ainda por cima com tantos anos

E tanto ressentimento e ódio e azedou o vinho e o azeite rançoso,

Amanhã, depois do turno da tarde e não faço ideia do

Que estão a planear, parece que estou em Tenerife,

Há séculos atrás, a foder minhotas, sevilhanas e o que as tempestades

De areia traziam dos nórdicos, acordar sabe-se lá onde

E a sorte de ter o hospital logo ali, turno da tarde,

A guia turística finlandesa a procurar as cuecas nos lençóis

Enquanto eu a tentar dar com a saída do condomínio, não bebas muito,

Que esperam, chá ou, mas este Pouilly-Fuissé, nunca me teria

Preocupado com cerveja morta e cona aborrecida, isto sim

Toca nos sentidos todos com dedos de quem sabe que a eternidade

É um verão que não chegou a amadurecer as uvas e tudo acabou.

 

Turku

 

24.05.2022

 

João Bosco da Silva