terça-feira, 19 de outubro de 2021

 


Chouriças para Lambões

 

E se vos fosseis todos foder, que tal, vós que nunca tocastes os tomates

Do absoluto, tão cheios de palavras e de efemeridades, barrigas cheias de nada,

E se fosseis todos limpar o plástico do rio, que foi esquecido dos moranguinhos doces

Da aldeia abandonada que bem chupastes quando convinha,

Em Vilar de Ouro, vinho glorioso houvessem nomes de peso a dar-lhe alma,

Noventa e nove diria o senhor Parker Jr. e se vos fosseis foder,

Isto não é fácil com uma de André e duas de Bordeaux,

O Alexandre despertou agora todos os fãs do mundo quando há dez mil geadas atrás,

Sentando num radiador eléctrico, líamos o Duende dado por um velho amante,

Antes de subirmos o monte de São Brás, amante da irmã do mestre,

Que hoje num sossego absoluto aparentemente, se resignou à vida esperada,

Não a que lhe esperei, nunca se espera resignação de um mestre,

Por isso continuo a engolir tinto muitos anos depois, ficando surpreendido

Com um cu que se me abre quando me tinha prometido que nunca,

Aquela ruiva, aquela ruiva, aquela ruiva, foram reais, até à última gota,

Ou terão sido todas sonhos numa, numas noites vazias, que triste agora, olhar os dedos,

Errar,

As teclas, estes mesmo merdas que limpam o cu, que se meteram nas conas que desejaram

Um erro, porque sempre fui um erro, uma sardinha assada a mais, um copo

De alvarinho minhoto a mais, mais valia ter-me levado o rio mais os bonecos,

Valerá mesmo a pena mais uma manhã em direcção ao nada, encher chouriças,

Será justo depois do amigo me esperar, para falarmos dos filmes do Kubrick,

Ou do amadurecimento das cerejas, será justo, estar eu aqui ainda a testar a resistência

Do fígado, a capacidade dos pulmões para o suspiro e a falta de tomates para meter

Aquela lâmina japonesa nas tripas ou ao menos à moda europeia nos pulsos,

Caralho, uma de champanhe e duas de bordeaux, ainda ninguém se decidiu

A não ser a puta que nos leva todos os sonhos, continuo ao olhar os dedos

Que escrevem isto, como se nos visse a entrar no restaurante Barcarola,

Cada um uma francesinha, qual delas teremos que culpar, o ridículo da vida,

Adormecer-me-ia agora com graça, cor-de-rosa, aquele tom de loucura

Do Conde de Ferreira, quando tudo me alimentava a vontade,

Quando terminará este poema, ridículo, de saudades, de fim, de chouriças para lambões.

 

Turku

 

João Bosco da Silva

 

19.10.2021