quinta-feira, 8 de novembro de 2012


Húmus E Corações Dissecados

Piso um ouriço e a luz do Sol de Outono revela uma castanha húmida, quase dourada,
Acabada de nascer para acabar entre os meus dentes, inspiro fundo como quem quer absorver
Todo o aroma do húmus fresco e sinto vontade da sua carne quente quente, de a abrir e me
Encontrar dentro dela, além dos espinhos onde me escondo, vontade de me enterrar nela
E renascer, lentamente, eu todo cheio de vida e sombra só o que debaixo de mim, contudo,
Lembro-me dos corações dissecados, onde se procurou o amor, onde mora, onde cresce,
Onde morre, mas além da carne, só o vazio onde antes sangue e o amor se calhar esse vazio,
Uma ausência que dói, como o frio é ausência de calor, e aquece quando presente, será
O próprio calor do sangue, por isso eu hoje um morto por não a ter entre os dentes da minha
Vontade, ao alcance do desejo dos meus olhos, aquela cor de castanha ao Sol de Outono,
Húmida, brilhante, fresca, com o interior acolhedoramente quente, mas agora só um
Coração aberto em cima de uma mesa de metal, revelando-se vazio, expondo toda a sua nudez
Inerte de morte, gritando a verdade muda e impossível para o irmão que ainda bate,
Desencantado, porque tem que ser, porque ela não está, nem o húmus fértil que a traz à sua
Ausência, nem a castanha entre os dentes, só o espaço que ela ocupa em forma de saudade
E entretanto, fecho-me um pouco mais dentro do ouriço, pouso o bisturi e tento encontrá-la
No meu coração aberto, nas pálpebras que fechadas, numa inspiração profunda que procura
O aroma da sua excitação húmida e lavanda, a cor do seu cabelo que persiste na minha palidez cansada.

Turku

08.11.2012

João Bosco da Silva