Pastilhas Elásticas E Latas De Açúcar
“Poetry a fornication
against fate.”
Lawrence Ferlinghetti
Quando as pastilhas elásticas perdiam o sabor, já éramos
grandes e não as engolíamos,
Estávamos sós em casa da avó, íamos à lata do açúcar e
tentávamos trazer o sabor de volta
Às pastilhas, um pecado de certeza, ressuscitar os mortos, e
os cristais de açúcar
Quebravam-se nos dentes de leite, como será possível
restituir a doçura, o sabor a uma
Pastilha usada, aquilo só sabia a açúcar e parecia areia
numa bola de algodão humedecida,
Nada mais a não ser aquele sabor a pouco do que já acabou
quando se estava a gostar,
O açúcar resultava melhor na cerveja, mas fazia muita espuma
e o copo era pequeno
Para tanta festa, como fazer agora que é tão difícil estar
só, agora que a lata do açúcar da avó
Está tão longe, agora que se continua a mastigar a vida com
a mesma vontade com que se
Chupa o caroço de uma cereja e não tem onde se cuspir, o que
fazer agora que a cerveja
Já não precisa de açúcar e é das poucas coisas que, quanto
muito, adoça um pouco mais
Isto tudo, ou torna ao menos tudo menos amargo, já na altura
se sabia que nada trazia
De volta aquele sabor original da pastilha elástica, mais
valia tirá-la da boca e esperar que um
Tio nos comprasse outra, parar os queixos um pouco e colá-la
debaixo da mesa, ou na sola
De um sapato que descolou no dia da festa ou na boca daquela
vizinha de França,
O que está perdido está perdido, não vale a pena mastigar o
vazio que ficou.
Turku
12.06.2015
João Bosco da Silva