Postal De Natal Para Poeta
para a Tatiana,
Podia falar-te do meu Natal, daquela semana nas geadas
trasmontanas
Entre madrugadas de neblina e acordares tardios, almoços
esforçados,
Tardes nas tascas até ao jantar e o regresso paralelos acima
até
À hora dos paralelos serem um fruto difícil de espremer,
contudo
Para os lados da igreja tudo se destila, gota a gota, em
verso,
Sinto as hóstias roubadas à consagração e as manhãs
contrariadas
No pré-ateísmo acólito, podia falar-te do moleskine à
lareira
E das páginas onde o regresso impossível, onde as figueiras
sem folhas
E o verão no mesmo baú fechado do regresso, na companhia do
Papel de embrulho das prendas que também acabam com a mesma
sorte
E valem pela espera, valiam, agora não se espera nada, não
se precisa de nada,
Ou o que se precisa, também no baú fechado e impossível a
ser pó,
Ou esquecimento, chamem-lhe o que quiserem, haverão amigos
E fogueiras, nada será ressuscitado, mas haverá purificação
no excesso,
Haverá vinho e bagaço e a partilha de sonhos perdidos como a
troca
De cromos para as cadernetas que nunca se completaram,
O dinheiro não dava para as sandes na cantina na escola,
A banda-desenhada semanal e a saqueta de cromos da bonecada
da moda,
E nunca se viveu tão bem, como quando parece que se acabou
de viver
De verdade, podia-te falar dos poemas derrotados pelo
caruncho, fechados
Nas gavetas ou em disquetes desmagnetizadas pelo progresso,
Dos desenhos que se deixaram na praia da poesia, e a mão tão
melhor
Para o resto, até dos cães mortos que se deitavam a um canto
da lareira,
Dos gatos que agora apenas um escanzelado que eu odeio por
ser
Demasiado parecido comigo em tudo e nem é meu, podia
falar-te,
Contudo é melhor esperar, não fica bem falar do futuro como
se fosse já passado,
Mas com o tempo, os dedos pousam e o futuro escreve-se como
esperado.
08.12.2015
Turku
João Bosco da Silva
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