domingo, 4 de dezembro de 2022

 

Arrefecimento

 

“habituámos-nos a que

nos esqueçam”

Yannis Ritsos

 

Quando a fome te despe os sentidos e suavemente

As primeiras geadas te visitam a solidão,

É porque chegou o tempo das fogueiras e dos segredos pagãos,

Despertam lentamente os sonhos antigos,

Como quem acorda com a boca pintada pelo vinho

Que um avô morto pisou, friamente cintilam as estrelas

Como o mais belo copo de cristal vazio,

Numa manhã de sede maior, em que o despertador,

A faca do coveiro que abre caminho ao sangue,

Do coração do porco cevado à bacia de plástico,

Chega o inverno que nunca esqueceste e o verão,

Que ainda ressoa na pele, mora agora num canto esquecido

Na companhia dos mitos da infância e dos amores frios.

 

Turku

 

15/11-04/12/2022

 

João Bosco da Silva

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