Arte De Te Beber
Podia dizer-te que te quero abrir como uma garrafa de vinho,
depois de estudar o teu rótulo,
A tua origem, o ano da tua colheita, abrir-te lentamente e
deliciar-me com a tua abertura,
O som da rolha de cortiça a sair da garrafa e a deixar o
aroma encher o ar, deixar-te respirar,
Respeitar a tua cerimónia, podia dizer-te isso tudo e
colocar um pouco de ti no copo certo,
Agitar-te levemente, cheirando-te, procurando o teu tom
único, a tua transparência e provar-te,
Mastigar-te com suavidade, podia mentir-te, mas o vinho
encerra verdade, por isso te digo
Que a vontade é de te abrir como puder, e sem um saca
rolhar, enfiar a rolha para dentro da
Garrafa e engolir-te de pernas para o ar, sem te saborear,
não te quero estudar, tenho sede
De ti, quanto ao rótulo, deixar dele uma mancha de cola,
restos de papel arrancados com as
Unhas, como se faz às garrafas da cerveja quando se tenta
adiar mais um cigarro, quero beber-te
No desespero da solidão, não te quero partilhar com mais
ninguém a não ser com a madrugada,
E engolir, engolir-te toda até deixar de me sentir eu e
triste, até conseguir adormecer
Contigo toda dentro de mim, sabendo que vou acordar com a
cor da tua pele nos meus lábios
E a tua presença pesada onde dizem que habita o amor, não
consigo beber-te de outra forma,
Podia mentir-te, mas o vinho como tu, deve beber-se com
verdade e antes de ficar vinagre.
18-12-2013
João Bosco da Silva
Coimbra
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