O Monge e a Garrafa Vazia
Na última noite, no terraço do hotel,
Acabo a garrafa de sake que ontem me acompanhou,
A companhia podia ser pior, hoje, a uma distância segura,
Posso dizer que me foi inócua,
Esta é uma cidade para bolsos cheios de vontade,
De mais olhos com barriga, de andar, ao sol
E nas entranhas da terra, de ver tudo sempre
Pela primeira vez, de adormecer embalado pelo cansaço
E acordar antes do amanhecer, longe do mundo real,
Uma mostra insignificante deste sonho de meia-dúzia de dias,
A solidão de facto não se sente apesar do silêncio
E dos indicadores tomares o lugar das palavras,
A madeira será tudo o que ficou, a madeira de todos os
tempos
E santuários reconstruídos, há azares que vem por bem
E mais vale a chuva vir e lavar a cinza e esquecer o que foi
sagrado,
A memória insiste em pintar de dourado o que era verde,
Trocar as voltas, misturar sonhos com vontade,
Como se não fossem a mais absoluta verdade,
Há pouco, uma família acompanhou-me nuns versos,
Quase em silêncio, como se de repente, dessem de caras
Com um monge recitando mantras e é quase isso,
Na última noite, no terraço do hotel, com uma garrafa de
sake vazia.
Tóquio
21/11/2023
João Bosco da Silva
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