domingo, 3 de dezembro de 2023


 

O Monge e a Garrafa Vazia

 

Na última noite, no terraço do hotel,

Acabo a garrafa de sake que ontem me acompanhou,

A companhia podia ser pior, hoje, a uma distância segura,

Posso dizer que me foi inócua,

Esta é uma cidade para bolsos cheios de vontade,

De mais olhos com barriga, de andar, ao sol

E nas entranhas da terra, de ver tudo sempre

Pela primeira vez, de adormecer embalado pelo cansaço

E acordar antes do amanhecer, longe do mundo real,

Uma mostra insignificante deste sonho de meia-dúzia de dias,

A solidão de facto não se sente apesar do silêncio

E dos indicadores tomares o lugar das palavras,

A madeira será tudo o que ficou, a madeira de todos os tempos

E santuários reconstruídos, há azares que vem por bem

E mais vale a chuva vir e lavar a cinza e esquecer o que foi sagrado,

A memória insiste em pintar de dourado o que era verde,

Trocar as voltas, misturar sonhos com vontade,

Como se não fossem a mais absoluta verdade,

Há pouco, uma família acompanhou-me nuns versos,

Quase em silêncio, como se de repente, dessem de caras

Com um monge recitando mantras e é quase isso,

Na última noite, no terraço do hotel, com uma garrafa de sake vazia.

 

Tóquio

 

21/11/2023

 

João Bosco da Silva

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