Dizem Que O Que Interessa É O Conteúdo
O primeiro Möet & Chandon no último segundo do ano, em Helsínquia, anos depois das aulas de francês
Onde aprendi o nome da marca e nunca mais a esqueci por me parecer impossível, não se compara
Às primeiras Snappy no bar do posto da Guarda Fiscal em S. Gregório, quando ia visitar o meu pai
Nos dias em que estava de plantão. A casa de banho cheirava a urina, mas lá fora a relva irregular
Fazia esquecer todo o futuro que viria a tornar-me em algo longe e o gás saía-me pelo nariz e eu
Pensava que aquilo era o tal “chorar de felicidade”, nunca estive tão perto tão certo, mesmo com
As mãos sujas com óleo dos matraquilhos quando ainda me era permitido fazer roleta com os bonecos,
Quando entrava nos carros ferrugentos e cheios de vespas, apreendidos por contrabando e tudo
Me parecia natural como os meus avôs estarem vivos e com algumas rugas, longe longe, atrás dos montes.
Queres um craque, perguntava o meu pai e hoje não sei se era uma barra de chocolate extinto com esse nome
Ou um queque, lembro-me que ambos me tornavam os olhos maiores do que aquelas ostras em Londres
Ou a mísera colher de caviar em São Petersburgo. Dizem que o que interessa é o conteúdo, não a garrafa,
Mas a mim sabe-me muito melhor a Coca-Cola das garrafas de vidro, se calhar porque me lembram
O meu pai, fardado, tão grande, aquele homem que eu queria ser quando fosse grande, mas não consegui.
Enquanto eu viver ele será eterno na minha limitada passagem e nunca um deus me perguntou: queres uma Snappy?
25.07.2011
Turku
João Bosco da Silva
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