Tentativa De
Poema Enquanto Se Arrancam Cabelos Brancos A Fotografias
Quando
envelhecemos tanto, não pode ter sido nesta dúzia de anos, só mais uma dúzia
E nós tão
velhos, o cabelo empalidece com as exigências que nos fazem todos os dias,
Tu, já nem
cabelo, os teus filhos olham-me como eu olhava os amigos do meu pai
E agora eles,
aproveita que ainda és novo, eu se fosse da tua idade, não perdia nenhuma,
Enquanto invento
dedos para as que tive sem nunca ter, as que perdi, olho-lhes as mãos
E elas também
vazias, uma aliança, vá, e uma mulher a quem nunca os vi tocar com desejo,
Sempre doentes
quando eles por perto, e vinho, copos de vinho como quem apaga os anos
Que tudo
levaram, e só trouxeram cinza ao cabelo, dores onde nunca se imaginou dores,
Um cansaço
que não se demora em aparecer, uma resignação feita de desilusões acumuladas
E as mesmas
mãos que antes capazes de tudo dizem, se fosse da tua idade, agora, meia
dúzia
De anos e os
filmes que se viam às escondidas, em becos escuros, engolem como os anos
passam,
Perguntamos,
o que lhe fizeste, engoli, sem se dar por nada, mais um ano que passa,
Levado no
estômago de um anjo bêbado de batom vermelho nos lábios e ao chegar a casa,
A primeira
coisa é lavar o anel que ficou à volta da vergonha, passou, mais uns cabelos
brancos,
Menos cabelo,
se fosse da tua idade, quando não se pode pedir mais, como ser da idade
Das tardes
no rio até dar uma fome que só os amieiros, só a água âmbar, da idade
Da amizade
inocente, só a amizade inocente, sem razão, a real, da idade do Sol a
descolorar
O cabelo sem
se olhar para o relógio, até a mãe chamar para jantar ou o sino da terra dar as
Trindades,
ao menos da tua idade, quando já tão velhos e há tantos anos a dizerem-nos
Que da nossa
idade é que é, e sempre não da minha idade, sempre me senti mais velho do que
Os anos que
o tempo me deu, quando envelhecemos tanto, que ao acordar já não estava leite
Quente com chocolate
à espera em cima da mesa da cozinha, quem comeu a torrada e o papo-seco
Com uma
fatia de grossa de queijo e marmelada, pior de tudo, quem nos tornou as caras
tão sérias,
Que anos
foram, que só foram uma meia dúzia, que peso tinham se nem se sentiram e para
trás,
Atirados todos,
um por um, os melhores dizem, e já estão todos amontoados naquilo que duramos,
O leite
agora o que nos engolem sem consentimento, quando a alma cheia de cerveja e
abandono,
E agora,
aqui, casados, pais, divorciados, cansados, abusados, desiludidos, resignados,
traídos,
Batidos, da idade
que nunca imaginamos ter o gosto que tem, sabe a estar sentado num banco de
jardim,
Às espera
que as folhas amareleçam, que caiam, e que venha alguém varrê-las para um
caixote.
03.11.2012
Turku
João Bosco
da Silva
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