Tea Bagging
A estação de comboios, ao lado, esperava, gelada, as viagens
que não voltaria a fazer,
Não voltaria a partir, nem voltaria a escrever poemas no
vagão restaurante com uma
Cerveja quente, enquanto vivia a vida dos outros e
transcrevia a minha no papel
Suado das viagens do Verão, agora parece impossível o calor,
mesmo a marca
De gotas de sangue na neve, quente, nem um cão na rua, só eu
farejo em direcção
A mais uma perdição, a luz do dia ainda fechada como o resto
do dia, na sala estava
Um amigo bêbado, daqueles que se encontra a más horas de pé
esquerdo, tentava decidir
Entre mergulhar na amiga lésbica, já desfocada com os seus
grossos óculos de massa,
Ou afogar-se na cerveja que restava, nem todos dormem e
menos ainda são os que sonham,
Ao ritmo de uma viagem que nunca chegará ao destino na
noite, uma boca vermelha
Envolvia o saco de chá, dizia que gostava com leite, mas o
vinho não permitia vias lácteas,
Procurava com o olhar suplicante, extrair pelos poros
do escroto uma vibração que eu sentia
A escorrer em forma de saliva e sede, alguém acordava para
começar menos um dia, alguém
Se vestia, a nossa roupa no chão da casa de banho a fingir
sinais de amor, só fome na verdade,
E aquela sede de ruína, de ter-se bebido demasiado, de
paixão, pouco ou nada, apenas a fúria
Nos lábios e o desespero no olhar, uma solidão crónica que
se mata só com a desilusão,
O caminho de casa estava no sentido inverso, mas no fim,
quando não há mais caminho por
Onde ir, resta voltar para trás, não regressar, nunca se
regressa, o tempo não o permite,
O chá terá arrefecido, poderá até ter açúcar desta vez,
outro sabor fermentado por algo
Parecido à saudade, mas saudade como sentir falta de um dedo
onde outros dedos
Entraram e mal se estranharam, ela adorava tê-los na boca e
eu adoro a marca que a boca
Me deixou na solidão que estes dedos agora percorrem sem
arrependimento.
Coimbra
26-11-2013
João Bosco da Silva
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