Estou muito contente hoje, porque hoje não encontrei nem um
amigo, vi um acidente
E não era eu, estou a acabar mas ainda não foi hoje, ainda, as
palavras cansam-se de mim
E eu canso-me delas, estou farto porque não vale a pena,
como nada, os ecos continuam,
O passado continua a dizer-me que sou e ainda existo, mas
cada vez mais sou menos capaz
De ser eu, vou regressando aos poucos à inocência das
primeiras vezes, à ilusão
Consciente da ilusão, à fome dos dias quentes, à sede desses
mesmos dias, onde me afogo
Pelo simples prazer de me desencontrar de mim mesmo e de
todos os que me refletem,
Páginas e páginas para o vazio dos olhos que rejeitam e
aceitam todos os dejetos
Etiquetados, isto não é um cachimbo, é um cagalhão, Sol, o
lago exausto no futuro
E é onde me agarro a estas horas de canos para a comunidade
do digerido, sabes,
Podia ter sido mais se tivessem havido olhos capazes, mas
também escrevo contra
Tudo, escrevo contra todos, espero apenas o esgar dos
enjoados, a traição
Da minha inocência, a dor gratuita nas demasiadas horas
latentes entre o tédio
E o fim do mundo, cada dia, um buraco negro inelutável, onde
anda o Miguel Torga
A estas horas, que distâncias semeei desde os primeiros
passos neste chiqueiro
A que tantos chamam de poesia e tratam vestidos de senhores
e doutores
E impostores, se ao menos ainda houvesse uma Paris
solidária, com homens violentos
Na vida como nas palavras, irmãos das garrafas e das putas,
dos perdidos e dos desesperados,
Juro que me sento e me deixo ser gárgula esquelética ao Sol
dos dias cinzentos,
Não espero mais a não ser a derrota inevitável do meu
tamanho melindrado pelo nome.
Turku
30/07/14
João Bosco da Silva