O Apodrecer Das Uvas
No canelho perto da igreja da terra, onde em tempos leitoras
Comiam carne regada a fino, alguém diz, este é aquele do
livro,
Perguntam-me pelo deste ano e eu digo que capital, já não
espero
Milagres de que não espera nada do santo que nunca fui,
Sinto-me mais em casa debaixo da figueira, com Moledo nas
páginas
De um livro de digestão difícil, e se ninguém estiver a ver
Bebo uma lata de coca-cola e fecho os olhos enquanto engulo
anos
E devolvo centímetro e desilusões e as crostas dos lábios
Contaminados pelos verões em que se gastou a inocência,
Só mais um bocadinho, só mais uma última vez e deixam de nos
reconhecer
À primeira, os olhos procuram um lugar comum no rosto
coberto pela
Vergonha que nos quiseram impingir como hóstias secas em
manhãs de sede,
Se soubessem que apesar do tempo, dos anos multiplicados aos
Quilómetros, quando me sento no cimo daquela fraga, sou todo
eu,
Eu como se os joelhos esfolados do granito, eu como se as
unhas
Ainda sujas de brincar na terra a construir cidades do
futuro
Com as telhas meias podres de uma casa abandonada,
É aquele do livro, quando já seis e outro à espera de um ano
imprevisto,
Eu quase que a dizer que não, que eu o garoto de cabelo
queimado
Pelo Sol, que mora além, onde toda a gente se encontra
quando fecho
Os olhos numa tarde quente de Agosto, ignorando o apodrecer
das uvas.
Torre de Dona Chama
05.08.2015
João Bosco da Silva
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