Haikus de Monte
O pai lê o mestre –
sentados ao Sol
ambos fascinados.
Saltita ao Sol
o pardal –
o gato dorme.
A roupa estendida
saúda o Sol
em despedida.
Ladram os cães
ao longe –
batem talheres na louça.
O livro do mestre –
na capa brilham
gotas de orvalho.
A figueira sem folhas
um pinheiro japonês
sem agulhas.
As folhas dos nabos
ainda cheiram
à geada da noite.
Fendeu-se o muro
onde a água
já não passa.
A última folha do marmeleiro
recebe agora o Sol
de Inverno.
No tanque
as placas de gelo
brilham ao Sol.
As fragas cá me espera,
sempre,
para sempre.
Deixo o mestre ao Sol –
parto para o monte
da infância.
No banco de pedra gigante
Só eu me sento –
Além do Sol nada.
À esquerda a Lua,
À direita o Sol,
Eu e os Montes no meio.
As pinhas silenciosas
e os pássaros
não sei que me dizem.
No verão os incêndios,
de inverno as queimadas –
há sempre fumo no horizonte.
Entre uma Montanha
e outra
um mar de neblina.
Da janela do quarto
vejo o pôr-do-sol –
só a infância não amanhece.
Tocam os sinos,
pragueja a vizinha –
ainda há vida na vila.
No saco de plástico
respiram ainda
as folhas de louro.
Hora de almoço –
os miúdos gritam
e no ar mil aromas.
Os bugalhos esquecidos
nos ramos
juntos à infância.
Não invejo os que ficam
nem os que vão –
a dor é toda nossa.
Será que o musco
ainda reconhece
o peso dos meus pés?
Bebo o café ao Sol –
não sei
o que me aquece.
Subia e descia a montanha
com Kawabata –
atravesso-a com Bashô.[1]
Sempre teremos
Paris na ilusão
e o Porto na memória.
Despeço-me
antes do Sol
nascer novamente.
Janeiro 2017
Torre de Dona Chama - Porto
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