Partida
Quando parto, todas as caras estranhas me parecem feias,
Todos os cus um volume amarelo de gordura que alivia o peso de ser
De cada um e lhes dá vontade de encher este mundo de mais idiotas,
Quando parto, todas as lágrimas me são estranhas
E apenas compreendo a tristeza das gotas de chuva nos vidros
Dos autocarros ou a distância da montanha, pintada na janela,
Que se cobre de neblina com medo das saudades,
Quando parto, parece-me sempre que nunca chegarei
A lado nenhum, fico em vez em equilíbrio entre o adeus
E o próximo abraço, tão incerto como o próximo passo,
Quando parto, lembro-me de todos os gatos mortos
E dos seus últimos olhares cheios de eternidade,
Quando parto, parece que vou despindo a alma pelas montanhas fora
E quando chego, não sei mais quem me fui, só onde me deixei.
Lisboa-Helsínquia (Espanha)
28-12-2017
João Bosco da Silva
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