domingo, 29 de dezembro de 2019

Natal Em Berna 

É Natal, do outro lado da rua os turistas tiram fotos 
Ao lado da casa onde Einstein morou uns anos, 
A madeira crepita na lareira centenária e Kerouac 
Remenda o saco-cama podre como uma cirrose, 
Deitado nesta poltrona numa cidade estranha, 
Sinto-me em casa, a família está junta, 
Contudo sinto que é um estranho quem segura 
O livro que releio, estas mãos, sempre tão cheias 
De distância e prontas para o vazio, 
Da janela a rua cinzenta espelha-me a alma 
E no lume ardem as memórias que já não me pertencem, 
Enquanto a noite se aproxima sou esquecido por tantos, 
Mais uma página para nada, seja ela em branco então, 
O Natal tornou-se num beliscar para ver se ainda se está acordado, 
Aos meus pés o gato é a capa de um livro que nunca escreverei, 
Uma companhia aos tantos que escrevi para o mesmo efeito, 
Como todos os Natais que se repetem  
Como o dizer o próprio nome em voz alta no escuro, 
É Natal e a chama de uma vela, sem gravidade, é redonda. 

Berna 

25.12.2019 

João Bosco da Silva 

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