quarta-feira, 31 de agosto de 2011


O Crescer Das Unhas



para Sara F. Costa,



As unhas crescem e não interessa a pele que lá ficou, no esquecimento, nunca ninguém se lembra

Do último cigarro, mas será sempre o último e a primeira gota de água não ajuda mas começa

A transformação desconfortável numa corrida desnecessária, porque o que nos vai cair já vem a caminho

E as unhas crescem, ou dão a ilusão que crescem, a carne que morta, desiste e se retrai, como um

Último beijo que se sabe último beijo e às vezes mais vale encolher no meio de um rio frio,

Lá no fundo escuro, sem olhos cá em cima, sem ponte, só o silêncio e a eternidade que todos ganham,

O fim das tardes depois do toque da trindade, só os cães fiéis companheiros até da solidão dos homens,

Os paralelos vibram e as unhas crescem, enquanto os lençóis se puxam para cima, alguns

Além do último cabelo desalinhado, os olhos desviam-se, mas quando há, há e acabou, mais vale

A resignação de um olhar verde de ódio, porque tu te mataste e nunca mais serás quem te criei,

Quando estrelas e geada fria à lareira, o poeta esquecido na vila desconhecida jaz numa campa sem nome

E a Lua diz que as unhas ainda lhe crescem, já não levam epiteliais rasgadas num suspiro pedido

A beijos violentos até que sabor a sangue também e só os dentes têm a profundidade necessária

Quando as palavras têm o peso de uma pluma, mesmo quando profundas, mesmo quando

Parecem eternas e cheias de promessas no infinito que o vento leva como se dois dias a eternidade,

Por isso os dentes fundos, mais uma semana, a durar durante o verde, o nojo, a impossibilidade

De matar com o esquecimento, nem o Sol se vai quando se põe e a Lua diz que as unhas crescem,

Diz também que o amor cresce da ilusão e se torna ódio pelas evidências, os olhos fecham-se

Mas sentem-se abrir lá no fundo, escuro, frio, do rio que na infância quente e hajam silvados

Para a gente ver se ainda sente e um Ventil para partilhar com os amigos, enquanto se espera

A hora de partir para outra partida, o amanhã tarda, os pontos finais evitam-se como as despedidas,

Porque enquanto houver mais uma vírgula, as unhas crescem e até lá ainda se espera que aquela

Morenita espere, lá mais à frente, no caminho dos caminhos que se cruzam, mas sem ilusões

Que Agosto foi há muitos anos e o rio sabe hoje a saudades porque a carne que se veste tão longe

E o céu mais baixo, mesmo que as unhas cresçam, mesmo que não parem de crescer.



31.08.2011



Turku



João Bosco da Silva


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