Cheiro Do Tempo
Um cheiro como a morada de um outro tempo, se forem ignorados os sentidos restantes,
A madeira que arde nas lareiras, o fumo misturado com o ar frio e a humidade que cede
Às temperaturas negativas, olhos fechados e é uma daquelas manhãs em direcção à escola,
Passando pela esquina onde vive a mulher que nunca sai à rua e pede a quem passa
Que lhe coloquem as cartas, que atira desde a varanda, no marco de correio, falta o cheiro a bolos,
Os olhos abrem-se porque faltou a pastelaria e estranha-se o tempo em que o corpo depende.
Tão próxima tu, quando alguém com olhos tão diferentes, te carrega a presença no ar
E ouvi escrever que é impossível amar alguém sem cheiro, pergunto-me que perfumes
Terá usado a minha mãe quando eu ainda tão longe, mais perto do paraíso, as chaves
De viagens breves, ilusões de papilas gustativas confundindo a inocência com palavras grandes.
A lavanda sempre me tornou as mãos mais pequenas e as inspirações menos contrariadas,
O incenso tem o sabor metálico dos sábados de manhã entre granito, orações e cantos desafinados,
Os pêlos queimados são quentes como o sangue dos porcos que fumega na geada,
E as mãos doem no ar frio de Dezembro, mesmo que seja Abril e um cigarro aceso
Demasiado próximo, o teu suor, impossível de encontrar além do teu corpo,
Por isso procura-se a essência do luar na esperança de mais um regresso a ti.
Bilhetes para sonhos acordados, de recordações manifestas e um momento além da superfície
Das roupas que os olhos abertos nos vestem, os cheiros, uma quebra no tempo
Que corre pela eternidade e depende dos sentidos para se fazer notar no espaço que altera.
16.11.2011
Turku
João Bosco da Silva
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