À Lareira Com Um Copo
Todo o suor bebido à lareira, apressando o sono, já que não há ninguém
Com quem bater umas cartas e as primas todas enrugadas, todas mortas,
A gaita também mais enrugada que nunca e só acorda em sonhos,
Mas ainda sabe bem passar as mãos nas pernas de uma pele bem esticada,
Macia, bem diferente da dureza de enxada que torna as mãos duras, gretadas,
Como a rua lá fora, enquanto cai a geada, dura, gretada, e não sei
O que as chamas me querem dizer, a mim, de mãos cruzadas, copo
Cheio ao lado, a caneca de dois litros já a meio, os meus netos homens,
Eu só, com o meu suor, doce suor, sangue do senhor que me absolve
De todos os cães mortos, todas as tareias que dei, só para provar
Que eu o mais forte, porque não há quem tenha mãos como estas
Capazes de arrancar o aguilhão de um escorpião, depois de já ter
Sido envenenado por um, pior foi a bala que me meteram nas tripas,
Mas eu aqui, duro, a tentar perceber o que o lume me diz, segurando
No copo, levando-o aos lábios, sempre da mesma cor, de vinho,
Finos, quase esquecidos, aqueço as botas que remendei com arames
Sentado no banco pequeno que fiz uma tarde aos sol, o jantar
Foram uns coelhos do monte, mas não sabem como dantes,
A comida sabia melhor quando a mesa cheia, mesmo quando pouca,
Jogava umas cartas, de televisão não percebo, não sei ler
E já ouço pouco, que grande deve ser o mundo, eu tenho parte,
Lameiros, soutos, montes, poços, vinhas, tenho um mundo meu,
Foi maior, agora andam todos por aí fora, e só eu bebo o vinho
À lareira, no Inverno, nesta noite é capaz de nevar, vou-me deitar,
Está frio e não me apetece descer à adega a encher a caneca outra vez.
07.01.2012
Turku
João Bosco da Silva
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