Cemitérios Minhotos
para a Mónica,
As únicas
palavras que trocámos foram no dia do seu aniversário, ela nas escadas à
entrada
Da escola
primária com as amigas, um saco de plástico com comida, queres, com um pedaço
De caranguejo
na mão, não verde como na praia, cor de laranja, olhei para as amigas entusiasmadas
A trincar o
exoesqueleto, não gosto, quando nunca tinha provado, nem sabia se gostava
Ou sequer
que aquilo se comia, engoli a minha ignorância e mais uma vez fui vencido pela
Timidez e
pela vergonha, gostava dela e não sabia porquê, era bonita e queria prová-la,
Mesmo que
não soubesse como, mas eu um estrangeiro ali, como tenho sido sempre,
Com as mãos cheias
dos frutos da vergonha e da timidez, vazias, até vir a garrafa, ali todos
Filhos e
filhas do mar e eu apaixonado pelas cerejas nas suas orelhas enquanto a procissão
passava,
Não gosto, a
procissão passou e alguém comeu também as cerejas e lá ia então, com
A vizinha
que era diabética e tinha filhos velhíssimos, até andavam na tropa e salvavam
de aviões,
Levar flores
ao cemitério a nomes que eram só uma pequena cara séria, não se brinca na
eternidade,
Não se
permitem sorrisos por lá e apesar de não se ter provado antes, não se lhe pode
dizer,
Não gosto,
portanto arrependo-me do sorriso com o qual não lhe agradeci, porque afinal
gostava,
Só ainda não
o sabia e poderia, quem sabe, ter-lhe tocado a mão que me estendia aquele
pedaço
Cor de
laranja de mar, podia ter sentido um pouco daquela carne quente e viva com um
nome
Que ainda
hoje me desperta na boca o sabor doce daquelas cerejas que não comi, aqueles
lábios,
Queres, e
eu, não gosto, por ser mais fácil abraçar o vazio que o tamanho de uma
possibilidade
E a vizinha
lágrimas nos olhos e eu preocupado com o açúcar, deve ser do cheiro do
cemitério,
Pensava, a
flores podres, água verde, cera queimada e pedras brancas escurecidas pelo fumo
De velas,
onde nomes que a carne esquecerá antes delas e caras sérias que sabem tudo
aquilo que não sei.
11.11.2012
Turku
João Bosco
da Silva
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