“Viagem Ao Fim Da Noite”
O bidão onde o cão dormia e se refugiava dos foguetes da
festa está vazio, a manta velha conserva
Quase tanto dele como a memória, uns quantos pêlos, faltam
os olhos comidos pelos vermes como
O verme que o matou, nem sei se me revolte contra a morte se
contra os seus dedos conscientes
E vivos, conheço mil e uma causas que levam um coração a
parar, mas nunca compreendi as suas
Razões, é sempre um erro tentar encontrar o que motiva um
músculo independente que por teimosia rasga
Os dias com vida e sangue, resta engolir, o sangue, até
ficar doente e vomitá-lo depois negro,
Em linhas finas e irregulares que tentam dar um sentido à
perdição, bebe-se, fuma-se e fode-se
Sem cuidado ou moderação, encosta-se a vida à parede como se
fosse a própria morte, mas esta
Com sugestões atrás da orelha, vai que eu não sou para ti,
tu imortal e o bidão vazio à espera
Do medo e do frio, dos olhos no infinito, a culpa disto tudo
é dos poetas que tratam a eternidade
Com a mesma familiaridade com que tratam as palavras e a prometem
como prometem o amor,
Com o mesmo convencimento que são capazes de trazer a carne
toda ao pêlo que ficou agarrado
À memória, mas é mais real o ladrar de um cão assustado pelo
quase silêncio da noite de últimos
Candeeiros da vila, que todos os poemas do mundo, a noite
chega sempre ao fim,
Mas nem sempre o dia vem para lavar todas as suas sombras.
09.03.2013
Turku
João Bosco da Silva
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