A sala um negativo fotográfico de O Café Nocturno de van
Gogh, embebido em melancolia e
A promessa de um frio lancinante além da porta que insiste
em abrir-se contentemente
Cuspindo almas envoltas em corpos envoltos em peles ou de
uma leveza maior e o interior
Mais cheio de fogo transparente, uma outra aguardente, de
batata dizem, e água da que
Passou muito tempo sólida, a mesa ao centro, num lugar onde
centro impossível,
Cadeiras estrategicamente colocadas para o reconhecimento
fácil do volume nos bolsos
E da braguilha, o recheio dos bares russos, cada um com um
ar mais suspeito e vicioso
Do que o outro, uma ambiguidade afogada no ar rosado e
escaldado pelo frio e pela vodka,
As putas sentadas nas cadeiras e as putas sentadas nas putas
e as putas sentadas no frio
Dos bolsos cheios e no dos bolsos vazios que ao menos uma
braguilha farta, ou uma cara
Estrangeira com promessas de plástico lá fora, que já venho,
nós uns trocos, tantos para tão
Pouco, um jogo de bilhar apressado, espremido entre a
paranóia e a claustrofobia ao sovaco
E perfume demasiado afiado e doce, apontado ao fundo dos
colhões do cérebro, tacadas
Concentradas nas pernas que se descruzam em sorrisos e
insinuações de puta, ao menos
O interesse directo e a sinceridade de batom vermelho para
esborratar os tomates
E roçares brutos de um carinho siberiano, falta o do fato
branco, junto à mesa de bilhar,
Mas está o tempo a substituir a sua presença fantasmagórica,
neste hotel Moscovo,
Em São Petersburgo, onde as bolas teimam em esticar o tempo
e alargar uma conta incerta,
A carteira a tornar-se cada vez mais seca e cresce a vontade
de fugir dali ou foder uma daquelas
Putas, vontade escondida da vontade até, que todos
católicos, rodeados de uma ortodoxia
Treinada pelos séculos dos tubérculos e dos regimes de outro
estômago, os tacos perdem
A sua faculdade recta e parecem um tesão saltitante no meio
de uma multidão de praia,
Se ao menos mais de menos trinta graus lá fora, um cigarro
que logo um a cravar na língua
Dele e um gajo sem perceber a mostrar-lhe o isqueiro e o
maço e ele as duas coisas,
Toma lá, vai lá, não apetece ir fazer companhia ao
Dostoievsky que a vida ainda vai em pouca
Miséria e até se saciar, muita beiça desesperada, cansada do
dono, muito verso desesperado
Cansado do dono, uma colecção de garrafas vazias, livros
consumidos como se escritos por
Alquimistas, quadros quase lambidos, também ali perto no
Ermitage, a vontade de levar tudo,
Mais, para deixar a apodrecer entre as lágrimas dos que
ficam e o seu esquecimento,
Fica assim, empatamos, vamos sair daqui, mas antes, bebemos
uma cerveja Baltika.
24.07.2013
João Bosco da Silva
Coimbra
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