terça-feira, 1 de outubro de 2013

Reminiscências Crepusculares

Há meses que não via um horizonte tão limpo, hoje morreu muita gente e pelo menos
Um poeta, porém, os tractores regressam poeirentos, as moscas adivinhando o frio,
Pedem a atenção de uma mão e há já uvas comidas pelos pássaros, um gato vê-se tentado a
Provocar um escorpião, mas logo se arrepende, o horizonte tão limpo, a canícula desfeita,
O gato vencido, todos vencidos por outros horizontes cortados pouco depois de jantar,
Um poeta que não escreverá mais, contudo, carros com bandeiras com as cores de sempre
Mentem às ruas, promessas de um dia, para um dia, a democracia nesta terra é tão estranha
Quanto a moral católica e o respeito às tradições convenientes, mesmo assim, os pimentos
Amadurecem, vermelhos como os lábios e a máquina de escrever de uma Aliide Truu jovem,
Finlandesa, como a do filme Puhdistus, prefiro o livro, porque lhe dei a cara que quis e os
Lábios sempre vermelhos, menos quando nos meus dedos, a voz rouca dos cigarros e de quem
Gosta de engolir esperma em ruas desertas e nos quartos das amigas quando elas não estão,
O horizonte tão claro como o passado, tão vivo como o vermelho a pedir mais dentro,
Enquanto vozes como moscas a incomodar com a proximidade do frio, agora resta esperar
Que os figos sequem, que alguém ganhe para alguém ser derrotado e acabar com o ruído de
Fundo que apodrece as uvas, assusta os gatos e decompõe poetas, de quem afinal, toda a
Gente gostava e admirava, não me pronuncio, prefiro evocar a morte dos momentos vermelhos,
Atrás dos olhos que o horizonte ignora, lavo-me nas águas limpas de um poema sueco ou no
Tanque de lavar a roupa debaixo do marmeleiro, ambos vivos, o sueco e o marmeleiro, mais vivos
Que os altifalantes diluídos pelo crepúsculo e reduzidos ao incomodar das moscas, chupadoras
De sangue, que adivinham que o frio está para chegar que o Inverno não tarda e será longo.

Torre de Dona Chama

23.09.2013


João Bosco da Silva 

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