Foste Agosto
para Rui Pires Cabral,
Foste Agosto, passei os teus Novembros debaixo de uma
figueira, não longe da tua aldeia,
Visitei as cidades onde nunca estive, e aquelas em que tu
não estiveste, revisitei as outras,
Somos estrangeiros para esta gente, só os canteiros nos vêem
além da camada
Do pó estrangeiro, durante o agonizar lento da canícula a
tua morada foi refúgio,
Por entre a incessante pestilência dos programas da tarde,
foste o reencontro
Com as fotografias
onde reconheço sempre alguém nos teus, foste os morangos
Que não consegui comer naquela manhã de Domingo já depois da
procissão da tarde
Na ressaca da romaria, nas tuas páginas reli as cartas que
depois de outros verões
Trocava com quem não ficava na vila, cresci de partidas,
agora sou eu quem nunca permanece,
Fizeste-me procurar no espelho algo além das marcas que me
afastam dos verões
Em que dava tempo ao cabelo de ficar mais claro, ninguém
sentiu o cheiro,
Mas deitado na rede, fumei contigo um charro e não senti
medo, o coração
Manteve-se ao ritmo do balançar lento, separam-nos umas
décadas,
Mas como faziam com a arte sacra, visto os teus poemas com a
minha época perdida,
Também já não digo que tenho a vida inteira pela frente, só
o horizonte que me viu passar,
A figueira, a tua morada e mais uns quantos poemas que
espero que também sejam a morada
Do Agosto de alguém que se encontra cada vez mais fora do
lugar, perdido de si para sempre.
25.08.2015
Turku
João Bosco da Silva
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