Cresce E Desaparece
Quando era miúdo, não deviam mostrar tudo na televisão, ou
então só via
Os bonecos de manhã e depois de fazer os deveres, se calhar
os adultos
Viam todos os horrores do mundo, daí se chatearem com
partilhas e
Tão sérios e cheios de segredos e sorrisos, que eles
chamavam amarelos,
Mas a cor era algo nos olhos, um brilho de medo, não sei, se
calhar o terror
Apenas uma semente, regada ao longo de décadas, estrumada,
bem estrumada
Com o sangue distante de vidas longínquas e remotas,
lembro-me de areia
E americanos e petróleo a arder, a mesma coisa que matava os
peixes
E os passarinhos da praia, diziam que se fazia gasolina
daquela merda viscosa,
Que me enjoava quando atestávamos a 4l em Espanha para ir a
Trás-os-montes,
Não se sabia tanto de tudo, as coisas demoravam mais tempo a
chegar
E quando chegavam, tinham a distância do tempo a tornar tudo
ainda mais
Longínquo, hoje temo que cada gole de cerveja seja o último
para me tornar
Num número de uma guerra civil qualquer, cujos interesses se
escondem atrás
Da ignorância e da cegueira, se apoiam na revolta que
alimentam, se calhar é o castigo
Por a memória colectiva ser demasiado curta, por se ler
história como ficção, não sei,
Cada vez estou mais certo disso e menos de tudo resto,
quando era miúdo, se calhar
Passei por uma fase de esquecimento, um período entre um
terror e outro, sim,
A guerra fria e o medo às bombas, agora o medo é aos olhos
que entram no bar,
Com um grito, evocando uma razão estúpida e o apagar
incompreensível de todos os sonhos.
Turku
14.11.2015
João Bosco da Silva
Sem comentários:
Enviar um comentário