Como Uma Bic Entre Os Dedos
Nesta madrugada, enquanto estrio esta Bic preta,
Quantas adormecerão com o esperma de outro no estômago,
Será que alguma se lembrou de mim, um segundo que fosse,
Quando o primeiro filho nasceu delas, lembro-me bem do poema
Que começou isto tudo e nem fui eu quem o escreveu,
Foi um acto de terrorismo, também eu o tenho sido
Mesmo que a erva em Agosto por mim adentro,
Agora sem pinga de fanatismo, além da fome pelas madrugadas
Pouco mais me resta, tenho a tinta quase toda ainda
E já se digerem as palavras num hálito adocicado de sangue
ácido
Pela manhã num acordar longe dos meus olhos,
Serei ainda um nome, um raio de sol no cabelo,
Um grão de areia que se trouxe da praia nos lábios,
Uma companhia nas insónias, um gato morto cuja cor
Se esqueceu, a tinta arrasta-se como se a implorar
misericórdia
Ao esquecimento, também a mim me engoliram,
Mas de certeza que hoje não passo de um sabor familiar
Como esta Bic entre os dedos enquanto amanhece.
08.05.2016
Turku
João Bosco da Silva
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