Hoje, na varanda, enquanto engolia uns goles de sake à uma e
meia
De uma noite clara do norte e olhava a bandeira
orgulhosamente
Pendurada na varanda de emigrante, lembrei-me das primeiras
bandeiras
Da minha vida, penduradas no posto da Guarda Fiscal e na
aduaneira
Antes da ponte onde o meu pai comia as refeições quentes envolvidas
Em panos de cozinha que eu lhe levava, com os meus cinco
seis anos,
Ele um herói de pistola à porta de Portugal, uma casa grande
Com cheiro a eucalipto e uma língua como a que se falava em
casa,
Eu na altura era contrabandista de pastilhas elásticas e
iogurtes,
Lutando contra a corrente do ribeiro para salvar os
fantasmas
De plástico, brindes de um cromo premiado, caça-fantasmas,
Tinha a caixa de fósforos quase cheia de fantasmas
minúsculos,
Todos corrente abaixo, menos eu, e do outro lado a senhora
Da mercearia galega uma língua igual à do Son Goku dobrado,
Nada de bandeiras nas pedras da ribeira que hoje
atravessaria
Em três passos, hoje que um pontão e na ponte nem um
bivaque,
Só o fóssil de um brasão de um lado e de outro, neste ano
Que ameaça tudo e mata mais os que de olhos no céu
Festejam a liberdade como se fosse algo que ainda exista,
Hoje, olhando uma bandeira, estrangeiro aqui como em todo
lado,
Como a própria bandeira, a mesma daquele tempo em que
Ia ao pão com cem escudos e já era grande, e as couves
cresciam
Apesar dos caracóis enormes e dos bolsos vazios de
fantasmas,
Tão cheios de medo, não daquele medo da gabardina pendurada
No quarto onde dormia num divã, um medo de fogo-de-artifício,
Um medo de me distrair na felicidade num momento e ser
Engolido na loucura anónima que nos leva a erguer muros onde
bandeiras.
15.07.2016
Turku
João Bosco da Silva
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