quinta-feira, 14 de junho de 2018

Paterson Revisitado 

Hoje, entre a incerteza de mais um cigarro e uma página alheia, fecho o Paterson 
Só porque o sistema límbico me sussurra a memória de um cheiro de um sabão de Marselha, 
Contudo acabo por acender mais um cigarro, não uso os fósforos azuis, 
O isqueiro é como a vida, sempre cheio até que se acaba subitamente, 
Um fósforo é mais como alguns amores, não os que deixas à chuva, 
Tudo tem possibilidade de se acender, nem tudo de incêndio, tudo tem a certeza 
De se apagar, como um poema com uma garrafa vazia ao Sol, que se acende 
Nas cinzas de um outro escrito há um ano, sobre o sabão que se gastou 
E na pele apenas a vontade de mais um banho, seja com que sabão for, 
Recicla-se a vontade como se reinventam os dias, semeando a ilusão da eternidade,
Nos nossos dedos insatisfeitos, arde uma página pequena, segue-se outra, 
Coberta pela irremediável necessidade da tinta, o livro azul chama a alma à limpeza, 
Nada pode salvar o amor quando se cansa, só se aguenta o filtro na boca por distração 
E o poema termina como tem que ser, mesmo que nunca tenha tido razão para um primeiro verso. 

12.06.2018 

Turku 

João Bosco da Silva

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