Barco da Cristal
Sabes, a areia de Venice Beach pode ser tão fria quanto a terra
De Père-Lachaise, basta uma noite de inverno pobremente báltica,
A solidão gelada num estômago cheio de arrependimento,
Que farias diferente, se não fosse para cuspir nos olhos,
Não terias acordado neste mundo moribundo de certezas,
Sabes o Sol nórdico pode ser tão quente quanto o equatoriano,
Basta apertares os dentes enquanto esperas uma manhã
Que não conhecerás, olhando página a página os lábios onde foste,
E com as mãos vazias agora agarrar tudo, fazer de uma ilha outra vida,
Em vez de memórias e futuros que se calhar chegarão quando demasiado tarde,
Mas antes que adormeças, deixa-me ter mais um verso,
Mais uma oportunidade de amanhecer luminoso,
Mais um copo para as décadas que se calhar não terei que repugnar,
Diz-me só que as promessas encontrarão corpo apenas nos sonhos,
Ou numa Quioto futura onde nunca nos encontraremos,
Porque encontrarás mais uma distração que te guie
Ao cansaço e à resignação, espero-te na areia ou na terra,
Barco de cristal, desespero último do amanhecer sem ilusões.
15.01.2020
Turku
João Bosco da Silva
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