Haikus em Tempos de Cólera
Ignorantes e inocentes
festim para a morte –
assim é a vida.
O silêncio cortado
pelos grilos
a minha paz.
Com Issa no colo
o pai espera
a Primavera.
Pôr do sol nos olhos
a mãe suspira
pelos filhos.
As flores sem nome
tão belas
como o silêncio.
O mais poderoso
de todos os deuses –
Medo.
Não se pesa
o cansaço –
cai uma folha.
Nada é realmente
insignificante –
grão de areia no olho.
As ruas vazias
esperam
que o medo dure.
Luz acesa
no quarto vazio –
silêncio.
A palavra
que não se lembra –
pedra no sapato.
Do relâmpago
nada fica –
amanhece.
Recordações a preto e branco
como aquele fim de verão
na eternidade.
Os juncos daquele
Verão
hoje verde impossível.
Nos lábios distantes
azedou
o leite derramado.
Sobre a púbis dourada
os sonhos
bebem-se acordados.
Cabelo
sobre o papel
ainda me és?
Dançam as chamas
daquele pesado
feixe de lenha.
Ninguém lembra
os copos vazios –
amor.
Na almofada fria
nenhum vestígio
dos sonhos.
Com dentes de eternidade
agarram-se as palavras
ao papel.
Não será certa
a manhã –
apaga-se o candeeiro.
Turku, Março 2020
João Bosco da Silva
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