domingo, 5 de abril de 2020


O Verão da Gazela

para a Cesar,

As estrelas multiplicaram-se naquele verão, a lua perdia a definição
Da inocência, as mãos tornavam-se cada vez mais pequenas
E o espelho ridículo, jogavam-se as fichas todas numa noite ruidosa,
Ficava-se com os bolsos vazios sem incomodar os passos incertos
Pelo caminho de paralelos abaixo, cheio de solidão no peito
E um tesão que nenhuma punheta apagava, a emigrante mais bonita
Da terra, dezanove anos, e nós deitados à vez no seu colo,
A olhar o céu quente, nunca me perdoarei o fracasso nos olhos dela,
Aqueles lábios em forma de sonho que nunca cheguei a beijar,
Aqueles lábios que me contavam que tantos amigos provaram,
Até o membro da banda brasileira da moda, aquela tarde derrotada,
Sozinhos em casa dela, ela sentada na cama à espera e eu a olhar
O rio da ponte romana, sem conseguir engolir o salto, mais uma música
Para ver a areia cair por entre os dedos, cada segundo um nunca mais
Mais próximo, voltei a vê-la quando já tinha as mãos cansadas
De sujar o que até sem vontade engolia, ela casada, cansada,
Longe dos dezanove anos, nos olhos que um dia cegos de desejo,
Apenas tristeza, aquele colo quente fazendo companhia às estrelas
Que se multiplicavam, na toalha ao lado, uma desconhecida,
Todas as minhas cartas de amor de certeza perdidas, pior, esquecidas,
Setembro chega sempre e por vezes dura o resto da vida.


Turku

05.04.2020

João Bosco da Silva

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