Diatribe e Dionísio
Antes de mais, sejam bem-vindos a este circo,
Aqui está o último bufo para acabar de encher
A chouriça ou a revistinha, o engraçadinho
Que ninguém leva a sério, sempre com o caralho
Na boca, o borracholas das férias na terrinha,
O gajo que supostamente salva gente, vidas,
Quem diria, que profissão honrada, bato palmas,
Bate-me mas é uma punheta que com palmas
Não pago nem uma garrafa de vinho,
Aqui está, até se lhe dava uma ou duas,
Vamos ter ao hotel a ver, ecos de acólito
A hóstias roubadas da sacristia, nem o táxi
De regresso, nem a cuecas molhadas daquele
Esperma provinciano, lá dos nortes da europa,
Estou apenas aqui sentado, neste jardim do éden,
Sem ver luz há dias, engolindo a perdição,
Como quem conta os segundos, certo de que
O fim é a certeza absoluta de tudo,
O ridículo é uma aberração do nada que já não temo,
Quem não me enche o copo e o ego que vá regar
Os seus desejos com mijo de anjos, temos uma lista
De dois anos, provavelmente tudo caberá no cu,
Se calhar até nos deixarão cheiram um pentelhinho
Ou dois, com sorte do cu, é que nunca tivemos
Uma cara que desse vontade às senhoras
De desembainhar as beiças, com a idade é isto,
O ridículo das palavras, mas essas não, isso não,
Ruim como o vinho que me consola, tomaram
Os aldeões como tu, não é, não, tens que te dar mais,
Disseram-me isto num fóssil, tantas vidas vivi,
Acrescentou-me numa mensagem
Décadas depois de qualquer possibilidade
De arreganhar a beiça para estes lados,
Abro mais uma lata de cerveja finlandesa
Para me ajudar a engolir a bílis de tanto vinho,
Quem se lembra do Anthony Bourdain
Num hotel de cinco estrelas na Alsácia,
Provavelmente com o estomago cheio
De um riesling gran-cru e a testa cheia de cornos
Italianos, com uma vontade infernal
De Pho para o salvar de um momento,
O momento crucial, último e definitivo,
O último jornalista gonzo na verdade,
Posso ter provado a primeira ostra com o Hemingway,
Mas voltar a provar algo outra vez, pela primeira
Vez, só aquela ostra da sua infância,
Há uma coisa que não compreendem,
É que a língua com que crio estas merdas,
Poemas, ou aborrecimentos, é a língua que uso
Apenas para pensar, e ler cinco por cento
Do que leio por dia, agora agarrem num rolo
De papel higiénico e engulam-no,
Pode ser que os versos vos saiam mais limpos,
Oito anos depois, contudo, regressarei ao país
Onde realmente queria ter nascido,
Teria sido um plantador de arroz, ou no máximo
Um gajo de fato a dormir no metro,
Depois de engordar uma empresa como se
Estivesse a lutar pela honra do meu senhor,
Prefiro o plantador de arroz, ou o gajo enforcado
Naquela floresta perto do Monte Fuji,
Não na Alsácia, que sonho, morrer aos sessenta,
Depois de uma vida daquelas, chegar aos
Quase quarenta e olhar para trás,
Ver nada, olhar para o futuro e cansaço,
Ter a certeza que se leva uma vida de adiamento,
Que não se chegará a lado nenhum,
Porque terão sempre dois anos já de
Merda para engolir, e falta coragem, falta submissão,
Pele grossa nos joelhos para ajoelhar e pedir,
Que se fodam todos, também irão e serão
Tão esquecidos como a lata quase vazia
Que me acompanha, ter estado, ter estado,
É e será sempre mais certo do que ter sido.
23/10/2023
Turku
João Bosco da Silva